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PELO BEM DO BRASIL: o conselho de um ex-ministro de Bolsonaro para um ministro de Lula - 08.05.23


 Por Adolfo Sachsida (ex-ministro de Minas e Energia; e ex-secretário de política econômica)

Por três anos estive em cargos chave no Ministério da Economia, e depois assumi como Ministro de Minas e Energia. Falo com a experiência de quem já esteve na linha de frente da formulação e implementação de importantes políticas públicas no Brasil. Este artigo pode desagradar alguns, mas depois de muito refletir decidi escrevê-lo. Sigo aqui o conselho que o presidente Bolsonaro me deu quando me nomeou ministro: “Faça sempre o que for melhor para o povo brasileiro”.

Nos jornais de hoje o ministro Haddad diz “Estamos no caminho para deixar o país pronto para decolar”, apostando na aprovação da reforma tributária, do novo arcabouço fiscal e das reonerações tributárias para alavancar o crescimento econômico. Apesar de ser uma boa pauta econômica acredito que ela seja inexequível; e irá levar a um cenário de estagflação no segundo semestre desse ano gerando considerável pressão sobre a permanência da atual equipe econômica.

A reforma tributária só é consenso nos editoriais de jornais e no mundo acadêmico. Fora dessa bolha a realidade é bem diferente: a reforma tributária irá inevitavelmente aumentar a carga tributária de alguns setores (mesmo que seja neutra do ponto de vista de arrecadação). Além disso, a incerteza sobre o que será aprovado no Congresso e qual será a nova carga tributária de cada setor, o período de transição e a ausência de jurisprudência sobre o novo regime tributário irão paralisar o investimento privado no país. Melhor que uma reforma tributária ampla é reduzir a tributação toda vez que a arrecadação estrutural aumentar. Ou então atacar o contencioso tributário, as obrigações acessórias, melhorar a digitalização e os processos, e realizar melhorias marginais e consistentes no sistema. Melhorias marginais e consistentes tem efeito agregado importante, ainda mais se implicarem em redução de tributos (com a consequente redução do peso morto do tributo e aumento da eficiência econômica).

Se você não acredita em mim, então acredite ao menos em seus olhos. Em janeiro de 2022 o presidente Bolsonaro tentou reduzir o IPI. Atenção: reduzir o IPI pode ser feito por decreto (só depende do presidente da República, e não precisa de aprovação do Congresso). Reduzir o IPI beneficia imediatamente a quase totalidade da população brasileira, mas traz alguns empecilhos para a Zona Franca de Manaus. Pois bem, tivemos que reescrever 3 vezes o decreto (até excluir dele 95% dos produtos da Zona Franca de Manaus) até que o mesmo pudesse seguir em frente. Se com o IPI é assim você consegue imaginar o que irá acontecer quando você incluir nessa equação, além do IPI, o ICMS, o ISS, a COFINS, os regimes especiais, os estados e os municípios? Minha sugestão aqui é simples: esqueça esse tipo de reforma tributária. Você irá gastar um capital político enorme em algo que tem tudo para ser um novo Frankenstein e paralisar a atividade econômica do país gerando desemprego e queda na renda da sociedade.

A segunda agenda do Ministro Haddad é simplesmente tecnicamente errada: o novo arcabouço fiscal apresentado pelo governo é confuso, cheio de sub-regras, e uma garantia na expansão contínua do gasto público que só será sustentável com contínuos aumentos da já elevada carga tributária brasileira. Melhor é desistir disso e apresentar uma regra mais simples. Por exemplo, fixar um limite para a dívida pública e usar os superávits primários como instrumento para perseguição desse objetivo. Para tornar isso crível colocam-se gatilhos travando aumento de salários de funcionários públicos, contratações e outras travas orçamentárias a partir de determinado nível de endividamento. Essa regra é muito mais simples, transparente e exequível.

Em outras palavras, aprovar a regra fiscal proposta pelo governo terá pouco efeito sobre a credibilidade da política econômica ao mesmo tempo que implicará num desgaste junto a bases políticas. A visão otimista aqui, apesar de não compartilhar dela, é que o Congresso irá assumir o ônus político de uma regra fiscal mais dura. Em minha opinião, o governo irá lutar muito para manter uma regra que ao final terá pouco efeito sobre a credibilidade da política fiscal. Isto é, teremos uma nova regra fiscal que necessariamente aumenta a carga tributária, gera incertezas sobre a trajetória da dívida pública e diminui a eficiência econômica reduzindo o crescimento de longo prazo do país. Nesse ponto a evidência empírica é clara: ajustes fiscais via redução do gasto público apresentam resultados econômicos superiores a ajustes executados via aumento de tributos. Na situação atual do Brasil, a elevação de carga tributária irá reduzir o crescimento econômico, o que gera novos desafios sobre a ideia de um ajuste fiscal via aumento de tributos.

A terceira agenda do ministro Haddad é correta: reduzir os gastos tributários. Infelizmente aqui os exemplos do mundo real são desanimadores. Por exemplo, a desoneração de folha já consumiu mais de R$ 100 bilhões. Alguém realmente acredita que exista força política capaz de reverter essa desoneração? O maior gasto tributário é o SIMPLES, alguém acredita que o governo vai alterar o SIMPLES? Ou que irá tirar o benefício tributário de hospitais? Ou que irá reduzir as vantagens tributárias da Zona Franca de Manaus? Ou que irá alterar os regimes especiais?

Você já ouviu falar do REIQ (Regime Especial da Indústria Química)? Pois bem, em 2022 enviamos uma medida provisória ao Congresso acabando com o REIQ (como medida de compensação para poder reduzir outro tributo). Ao final da discussão no Congresso foi aprovada a extensão do REIQ. Em resumo, não só não conseguimos acabar com esse regime especial como o mesmo ainda foi prorrogado. A agenda de gastos tributários precisa ser debatida amplamente com a sociedade, e decisões importantes precisam ser tomadas nesse ponto. Contudo, no momento atual, acho difícil o governo conseguir aprovar reonerações importantes. Será um custo político alto para um resultado pouco expressivo.

Enfim, as três principais agendas do ministro Haddad, apesar de bem-intencionadas, levarão o Brasil a um quadro recessivo no segundo semestre. Se incluirmos aqui outras medidas econômicas equivocadas: elevação da meta de inflação, juros subsidiados pelo BNDES, aumento do crédito direcionado e fornecido por bancos públicos, fim das concessões e privatizações, fim da política de abertura econômica unilateral, fim da política de redução de tributos, aumento do gasto público, pouca ênfase na agenda microeconômica e na melhoria de marcos legais, ameaças de rever pontos da reforma trabalhista, muitos atores dando palpites sobre os rumos da política econômica, entre outros problemas, teremos um quadro de estagflação no segundo semestre: inflação e desemprego em alta; e PIB, produtividade e investimento privado em queda.

Dito tudo isso, aqui vai meu conselho a equipe econômica atual: foquem na agenda microeconômica. O Novo Marco de Garantias, o Novo Marco do Setor Elétrico, a venda de contratos da PPSA (que pode gerar R$ 300 bilhões ao governo) são todas medidas que já estão no Congresso e podem ser aprovadas com o apoio do governo. Além disso, a Secretaria de Política Econômica tinha em minha época várias iniciativas para aprimorar o mercado de capitais, de crédito e de seguros. Essas medidas podem ser ajustadas e enviadas ao Congresso. Enquanto fui Ministro de Minas e Energia igualmente me preocupei com a melhoria dos marcos legais. Existe um conjunto robusto de medidas no Ministério de Minas e Energia que podem ser enviadas ao Congresso para reduzir o custo da energia, melhorar os marcos legais de energia, petróleo, gás, e mineração, e impulsionar a entrada de capitais no Brasil gerando empregos e renda em nossa sociedade.

Em resumo, consolidação fiscal e reformas pró-mercado para aumento da produtividade são a chave para o crescimento econômico de longo prazo. Ter responsabilidade fiscal, reduzindo o gasto público como proporção do PIB e reduzindo a relação Dívida/PIB, e insistir na agenda microeconômica é o caminho trilhado pelo governo passado e que deveria ser mantido pelo atual governo. Essa agenda não dá manchete nos grandes jornais, mas gera emprego e renda para o povo brasileiro.

Termino esse artigo dizendo que o escrevi para honrar a promessa que fiz ao Presidente Jair Bolsonaro. Quando me nomeou ministro ele disse: “Faça sempre o que for melhor para o povo brasileiro”. E respondi: “Pode ter certeza presidente de que o povo brasileiro virá sempre em primeiro lugar”. A atual política econômica irá levar o Brasil a um desastre, e o povo brasileiro irá pagar essa conta via aumento da inflação e do desemprego. Já fui pobre, sei o que é o desemprego e a inflação. Sei o mal que a inflação e o desemprego causam nas famílias mais pobres. Esse artigo é minha modesta contribuição para ajudar nossa pátria, para ajudar nosso povo.


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CENSURA, FOLHA PREFERIDA DA MENTIRA - 02.05.23


Por Percival Puggina 

    

      Querem que nos habituemos a dobrar a espinha de modo silencioso e a rastejar reverências a nossos algozes. Já deixaram claro a que vêm. Aprendemos na experiência da vida que não desistem de seus objetivos e se valem de todas as tretas e mutretas para alcançá-los. Até a chacina de Blumenau serviu para justificar o injustificável, como, por exemplo, a imposição de meios de censura na Internet... De outro lado, conservadores e liberais – enquanto podem proclamar que “têm mais o que fazer” – se resignam facilmente aos maus tratos do Estado. Até não terem mais o que fazer porque a rota percorrida termina em inevitável sorvedouro onde tantas nações já se precipitaram.

 

O PL da Censura é a estampa de seus proponentes e defensores: profissionais do ardil, da arrogância, do estatismo, do liberticídio, do autoritarismo e da criação de narrativas. É sempre a mentira que necessita impor silêncio à Verdade, sua antagonista natural. A Verdade se impõe sempre que lhe permitem contrapor-se à sua predadora natural. Por isso, a censura trata de impor seus motivos. Eles não são razões da razão, nem do bem, nem da justiça, nem da moral.

 

Criatura da invencionice legislativa do ano de 2020, o projeto ganhou vida assim que o desastre eleitoral de 2022 chegou ao clímax do dia 1º de janeiro deste ano. Já então, a experiência dos meses anteriores mostrava onde se travaria a luta política e evidenciou o quanto era conveniente inibir o protagonismo da sociedade em questões políticas. Para os donos do Brasil, cidadão, eleitor, é sujeito que aperta silencioso e discreto o teclado da urna. O resto é para os profissionais.

 

E o mal parido projeto ganhou força, tornou-se urgente. Urgentíssimo. Os novos senhores do Brasil entendem que opinião é regalia de quem pode. O povo, fala no teclado da urna, a cada quatro anos. A partir daí, o silêncio é seu melhor e mais prudente conselheiro.

 

Nestas últimas horas do dia 1º de maio, escrevo sem saber por quanto tempo isso será tolerado. Penso, então, nos omissos de outubro do ano passado. Agiram naquela eleição como se não estivessem embarcados no navio que se precipitava para o sorvedouro. Fico me interrogando se, agora, a realidade ainda lhes chega. Haverá alguma janela, naquele universo paralelo desde o qual as decisões eleitorais do ano passado não lhes impuseram qualquer responsabilidade moral ou cívica?

 

Na história dos povos, a censura foi, sempre, exigência da mentira, ou da mistificação, ou de males ainda maiores. Por isso, quando a madrugada se aproxima, ergo o pensamento para Jesus – Ele mesmo Caminho, Verdade e Vida – rogando que vele pela nação brasileira e não se instale, aqui, o primado da mentira, eterna predadora da Verdade. 


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A TRANSIÇÃO PARA A DITADURA - 27.04.23


Por Luiz Philippe Orleans e Bragança – publicado na Gazeta do Povo de hoje, 27.

 

Mao Tse Tung, Mussolini, Hitler, Stalin, Fidel Castro, Chaves e outros promoveram o que se chama hoje anarco-tirania, o período de transição após a tomada de poder e que é parte do processo para sua consolidação total .

 

O livro vermelho de Mao deixa claro que o processo de tomada de poder é apenas o primeiro estágio, vem a seguir um período de combate aos “reacionários” e à “contrarrevolução”.  Ele estudou a Revolução Francesa e seu fracasso, bem como o sucesso da Revolução Russa, e já previa, em 1949, que segmentos da classe média na China se revoltariam, que o período de sedimentação seria longo e com alguns reveses. Entretanto, Mao estava confiante de que a força revolucionária triunfaria, pois com o poder formal tomado, o trabalho seguinte seria apenas liquidar as chances de outro grupo voltar.  Em seus estudos, passado esse período de resistência e consolidação de poder, o terreno político estaria livre para implementar e exercer a hegemonia total.  

 

Esse período intermediário de combate aos “reacionários” e “contrarrevolucionários” é chamado anarco-tirania.  É o momento de enfrentamento e expurgo de resistências dentro do aparato estatal, assim como dentro da sociedade. É quando os agentes revolucionários usam o Estado para criar caos e agir como tirano ao mesmo tempo; sem obedecer a qualquer moralidade, constituição, princípio legal ou direito individual. As ações por serem do Estado ganham falsos ares de legitimidade e não se restringem a liquidar pontos de resistência com força bruta, vão muito além: o Estado se transforma em promotor de destruição.

 

O caos e a anarquia - É engano pensar que o caos só desfavorece as forças organizadas do Governo e do Estado.  É mais complexo e os interessados em política devem entender como o caos e a anarquia são utilizados por todos os agentes políticos para conquistar e consolidar poder. 

 

As três fases: A primeira fase é quando o movimento revolucionário não está no poder, e cria o caos para desestabilizar os governantes objetivando destituí-los.  A segunda fase é quando o revolucionário está no poder e usa o caos para reforçar seu poder ditatorial suprimindo resistências e aniquilando todos movimentos geradores de caos, inclusive os que os levaram ao poder – sim, a revolução, assim como o demônio, sempre devora seus filhos.

 

A situação caótica, nesse caso, tem o objetivo definido de favorecer quem está no comando, pois este já se organizou para assumir mais controle, é um instrumento de destruição de resistências.  Caos econômico, fiscal, monetário, social e administrativo são causadores de anarquia.

 

A terceira fase é de institucionalização, a mais nociva: é a consolidação totalitária, a criação de uma nova constituição e novas instituições para garantir sucessão e perpetuação no poder.

 

E a Anarquia? Há pensadores tanto do lado liberal quanto do lado marxista que defendem a ausência de governo, ou anarquia, como alternativa. Mas a anarquia na prática não existe; é tão fugaz que é difícil de observá-la na história do mundo por longos períodos. Por quê? 

 

 

Não existe direito nem liberdades em um sistema anárquico. Ao contrário, todos revertem sua dependência a pequenos grupos, tribos ou famílias. E quando se distanciam destas aglomerações se tornam reféns do medo, receosos de perderem suas posses e liberdades para outros “agentes livres” que atuam sem limites. Por isso as sociedades, quando se deparam com uma situação de caos que possa levar à anarquia, logo se organizam em torno de alguém ou um grupo que está organizado para governar.         

 

Ditadores amigos do caos: Para reforçar seu domínio, Stalin promoveu expurgos draconianos, sem lógica e sem heurística, depois de sua ascensão para que todos o temessem e não conseguissem impedir que consolidasse seu poder na Russia. Hitler tinha os “camisas marrons”, que desestabilizaram a vida dos alemães antes e depois que este assumiu como primeiro-ministro até se firmar no controle de todo o sistema político alemão.  Mao Tse Tung promoveu uma revolução nas fazendas, indústrias e na cultura para eliminar toda a resistência econômica e social.  Fidel Castro também “limpou” Cuba de opositores, e assim como os demais, promoveu fuzilamentos públicos e notórios.  Hugo Chaves fez toda a classe média venezuelana fugir do país via interferência do judiciário.  Em todos esses exemplos, sem exceção, a consolidação do poder totalitário foi através do caos, do terror e tirania promovidos pelo Estado. Mas o que muitos esquecem é que a consolidação também não foi imediata; os revolucionários tiveram que enfrentar resistências internas e externas por longos períodos.

 

E o Brasil hoje? No Brasil temos nossos agentes do caos bem consolidados e ativos.  Black Blocks, UNE, Sindicatos, MST e MTST, por exemplo, são movimentos sustentados por partidos e pelo Estado e de caráter revolucionário, com organização, método e intenções claras de criar caos para chegar ao objetivo final: um Estado totalitário. 

 

Depois que a cúpula do Poder Judiciário se consolidou em torno da ideia, faltava dominar os poderes Executivo e Legislativo.  Com Lula, o segundo pilar do comando absoluto do Estado foi concluído. Depois de ter assumido o poder com baixa legitimidade e apoio popular menor ainda, ele tem tomado medidas para, nitidamente, desestabilizar todas resistências econômicas, politicas e sociais.   

 

Seu “governo” acabou com o teto de gastos e gerou caos no sistema fiscal e baixou as  expectativas sobre melhoras na economia.  Colocou um grupo terrorista como o MST no comando de um ministério, para criar caos no campo, onde está a sua maior resistência. Nas Relações Exteriores, gerou também caos ao bravejar que queria sair do dólar como moeda de troca principal e reposicionar o Brasil junto às ditaduras do mundo. Promoveu políticas na educação e cultura antinaturais para confundir, dividir e gerar o caos social, fragilizando a confiança da sociedade em si mesma. Lula engajou-se na segunda fase do caos e tirania.

 

Falta agora acabar com a resistência no Poder Legislativo e na opinião pública.  Na Câmara e no Senado seu domínio estará completo. Apesar de existirem vários parlamentares suscetíveis à corrupção, há também aqueles que se preocupam com a opinião pública, cuja parcela mais expressiva não quer ditadura.  São esses dois fronts que compõem a resistência e sobre os quais o cerco está se fechando – criminalizar parlamentares da oposição e censurar redes sociais é só um primeiro passo.

 

Como dizia Mao Tse Tung, em seu livro vermelho: “a revolução não é uma festa de gala…não pode ser refinada, prazerosa, moderada, sensível ou gentil. A revolução é uma insurreição, um ato de violência no qual uma classe depõe uma outra”. Ao destacar que a luta contra os “reacionários” tinha que ser implacável, Mao sabia que as chances de uma revolução fracassar são maiores que as de atingir sucesso. E é nesse fato que a sociedade respira. 


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ENTRE CABRAL E TIRADENTES - 24.04.23


Por Paulo Rabello de Castro - Publicado no jornal Estado de Minas em 22.04.23

 

Volta e meia, deparamos com a embaraçosa constatação: nós, brasileiros, guardamos mais intimidade com o insucesso. A proximidade de duas datas relevantes – 21 e 22 de abril – chama atenção. Ontem, num feriado nacional, o Brasil parou para lembrar Tiradentes, mártir de uma conjuração mal-sucedida contra a cobrança de impostos exorbitantes pela Coroa portuguesa. Hoje, em dia comum, lembramos o Descobrimento da Terra Brasilis, a chegada de Cabral ao novo continente da esperança tropical. Entre os dois episódios, pranteamos a dor com um dia sem trabalho. Nos EUA, a descoberta da América por Cristóvão Colombo – o Columbus Day – é o dia feriado para comemorar a chegada ao Novo Mundo. 

 

O Novo Mundo da esperança brasileira parece ter ficado para trás. Dados negativos da realidade diária vão enforcando e esquartejando a alma brasileira. Tiradentes passa a ser muito mais real do que Cabral no dia-a-dia do sufoco dos impostos, do susto, da insegurança nas ruas e, sobretudo, pelo abandono e indiferença a que estamos relegados.

 

Existe explicação para o fato dessa sensação estranha de perda. Como coletivo de nação, tripudiamos princípios fundamentais para o sucesso e desenvolvimento geral. Menciono três deles com prioridade. Representação. Federação. Participação. O primeiro deles é o suporte essencial da liberdade política, a Representação. O voto, em si, não basta para aperfeiçoar um sistema de aproximação dos representados aos seus representantes. A intermediação da vontade popular por um enxame de partidos políticos contamina o ambiente da Representação. A perpetuação dos representantes com direito a reeleições sucessivas infantiliza a vontade dos representados. Já não importa o que os políticos estejam fazendo, desde que lhes seja garantida a continuidade da representação. Entra ano e sai ano, são as mesmas caras com os mesmos vícios, aos quais nos habituamos numa Síndrome de repetição. A necessária reforma política teria uma pauta: direito ao plebiscito de iniciativa popular, o afastamento do mau representante (recall), o voto distrital, o fim da reeleição, o candidato independente. Todas essas são pautas perdidas no ambiente atual, dominado pela “governança dos onze” como poderia se chamar a protuberante atuação do STF.

 

A Federação é o segundo princípio estrangulado. Reunir-se em “federação” pressupõe certa autonomia das partes que a compõem. Mas criamos regras de suprema dependência fiscal e financeira ao poder centralizado em Brasília. A vida das pessoas acontece onde moram, nos seus municípios. Mas os tributos são recolhidos das pessoas nas suas cidades e vilas para ir “passear” em Brasília e nas capitais estaduais, de onde retornam – por regras de transferência burocrática – já desidratados pela extração dos pedágios políticos que sustentam as máquinas do poder central. Municípios são considerados dependentes das verbas federais ou estaduais porque os tributos transitam e somem. A Federação brasileira é uma ficção com o atual sistema de tributos “compartilhados” instituída pela CF88. Estados e municípios são sócios passivos do imposto de renda federal. Em compensação, a União invadiu a seara do consumo e tributa para si bens e serviços. A atual proposta de reforma tributária, em vez de “descruzar” essas intromissões de competência, pretende acentuá-las ainda mais pela redução da capacidade de tributar dos municípios. Se passar como está, a reforma tributária do governo Lula (que já foi proposta de Bolsonaro) vai iniciar a era dos cashbacks municipais. Os cashbacks serão as futuras “mesadas” de Brasília – devoluções de recursos que nunca deveriam ter saído das cidades de onde vieram – mandadas aos prefeitos como bondades do governante central para sustentar milhares de prefeituras sem caixa.

 

A falta de Participação na (pouca) prosperidade econômica do País completa o tripé da destituição da cidadania. A poupança nacional é o segmento mais estatizado pela voracidade do poder central. Quase ninguém percebe isso. O brasileiro poupa para financiar o governo. E o governo se endivida para engordar sua máquina. O item investimento passou longe das metas do novo “arcabouço fiscal” do ministro Haddad. Para pagar juros altos à dívida que toma na praça, esse mesmo governo cobra altos impostos e inflaciona. Os mais pobres ficam com essa segunda parte: recolher os mais altos tributos de consumo do planeta e a previdência mais onerosa. A incumbência dos mais ricos, que aplicam saldos, é usufruir os juros altos. Nem com muita bolsa família, BPC, auxílios disso e daquilo, o governo dará conta de cortar o ciclo vicioso de juros altos, muita gastança e pouco investimento, que expulsa a grande maioria do circuito da diminuta prosperidade e os empurra para o superendividamento e à subtração de futuro. Não à toa, a maioria dos jovens hoje responde que preferiria ter uma oportunidade fora do País.

 

Sem Representação, sem Federação e sem Participação, não admira que nosso consolo seja nos aninhar à sombra do patíbulo do mártir da Independência. Cabral nos desculpe, mas uma nova Primeira Missa precisaria ser rezada.


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A VERDADE FOI SEPULTADA VIVA - 20.04.23


Por Percival Puggina

         Sob sete palmos de terra e cinco anos de sigilo, a Verdade gemia dentro do caixão. A balbúrdia dos militantes nas tribunas, nos microfones, ante as câmeras, nas redações, abafava seus clamores. Parente próxima da Verdade, a Lógica corria de porta em porta e alertava nas esquinas e mesas de bar que ela sobrevivia; sufocada, mas viva. O governo gastava promessas, anunciava emendas, prometia recursos e cargos (a moeda oficial da compra de consciências em instituições enfermas) para que nenhuma comissão parlamentar de inquérito a fosse resgatar.

 

Era muito mais conveniente ao governo um inquérito que aplicou tornozeleiras e colocou atrás das grades mais de duas mil pessoas. Todas empacotadas com o rótulo de terroristas, ou vândalas, ou golpistas responsáveis por incitação ao crime e associação criminosa (vândalos reais e seus financiadores, se presos, estão no lugar certo).

 

Aos donos do poder vinha sendo bem mais confortável pespegar rótulos à oposição do que examinar os próprios meios de ação desde uma perspectiva moral. Ontem, a propósito, um jornalista da Jovem Pan retirou do baú da memória uma brilhante frase que o ex-senador José Serra usava para denunciar a conduta dos petistas no parlamento dizendo que batiam a carteira e saíam gritando “Pega ladrão!”.

 

Era muito, muito conveniente examinar aqueles vídeos, sepultá-los no ataúde da Verdade, mandar prender o secretário de segurança do Distrito Federal que estava em férias, destituir o governador do DF e convocar Bolsonaro para depor. Ao mesmo tempo, deixar solto o general Gonçalves Dias, sem sequer ouvir o Ministro da Justiça. Aos vídeos, diziam, impunha-se sigilo por uma questão de “segurança das próprias instalações de segurança do Palácio do Planalto”. Não entendo de segurança, mas reconheço uma hipocrisia.

 

O general Gonçalves Dias, também se soube ontem, foi Secretário de Segurança da Presidência da República nos dois mandatos anteriores de Lula e chefe da Coordenadoria de Segurança Institucional da ex-presidente Dilma Rousseff.

Com o que se sabe hoje, devo exclamar: Que inquérito, senhores! Que inquérito!

 

Aqui, desde esta pequena cápsula de trabalho a que chamo gabinete, penso no omisso senador mineiro Rodrigo Pacheco e nos enfeitados caciques partidários que com larga margem o reelegeram para presidir o Senado Federal. Talvez agora, que o chão se abriu sob seus pés e as vítimas dessa omissão caem no seu colo, o senador, enfim, se disponha à desagradável e inédita experiência de cumprir seu dever para com a nação.

 

A Lógica, sentada ao lado do túmulo da verdade, aguarda a CPMI e a exumação da parente sepultada viva.   


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A CAMA O SOFÁ E A CLASSE MÉDIA - 19.04.23


Por Percival Puggina

 

         Para usufruto da dupla Lula e Janja, o governo da União adquiriu um sofá ao preço módico de R$ 65 mil e uma caminha de R$ 42 mil para acalentar os sonhos do casal que tanto anseia por uma nação mais próspera. Faz sentido. Se o presidente quer que todos vivam bem, o exemplo tem que vir de cima. Ele está fazendo a parte dele.

 

A oposição reclama. Desenterra discursos antigos, de outros tempos – falas, imaginem só! – de maio do ano passado em que o candidato criticava, com caprichada oratória lulista, o padrão de consumo da classe média brasileira:

 

“Aqui na América Latina a chamada classe média ostenta muito um padrão de vida acima do necessário. É uma pena que a gente não nasce e a gente não tem uma aula: o que é necessário para sobreviver. Tem um elemento, tem um limite que pode me contentar como ser humano. Eu quero uma casa, eu quero casar, eu quero ter um carro, eu quero ter uma televisão, não precisa ter uma em cada sala. Uma televisão já está boa (...)".

 

Como se vê, naquele longínquo ano de 2022, falando na primeira pessoa do singular, Lula afirmou, imbuído de estrito ânimo franciscano, “haver um limite” quanto aos bens que o podiam satisfazer. Pois é nesse pequeno combo de utilidades essenciais que se incluem a tal caminha e o sofazinho confortável. E – por que não? – até mesmo um modesto sitiozinho em Atibaia.

 

No mês de janeiro, enquanto não davam jeito mais digno naquela choupana do Alvorada que iria ocupar, o casal ficou hospedado num hotelzinho de Brasília, o Meliá Brasil, cujas diárias beiram os R$ 7 mil, com café da manhã incluído, claro.

 

Em outras palavras, algo já está bem comprovado sobre o presidente: ele pode trabalhar mal, mas descansa muito bem.


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