Por Percival Puggina
Foi um excelente negócio! Lula era uma espécie de parâmetro para os governistas (kirchneristas) e para os oposicionistas. Os primeiros viam em Lula a mão amiga e o apoio necessário (com o nosso dinheiro); os oposicionistas viam em Lula o fantasma da mesma governança incompetente que assolava a Argentina. Felizmente, para a maioria, Milei pareceu mais promissor do que um governo com aplauso e apoio de alguém como Lula.
Era nítido que muitos eleitores rejeitavam Milei pelo seu modo de ser. E isso faz pensar naqueles que devolveram o poder a Lula (que loucura!) por não gostarem “do jeito de Bolsonaro”! Talvez por isso elegeram um presidente que aprecia a intimidade dos gabinetes, do avião e das comitivas companheiras. Não põe o pé na calçada.
Em que pese certa sintonia, Milei e Bolsonaro são bem diferentes, como tem sido dito. Um faz lembrar o outro por algo em que ambos são muito eficientes: a capacidade de se comunicar com a população. O brasileiro com sua metralhadora virtual para combater o crime e o argentino com sua motosserra para cortar o gasto público. E vai parando por aí porque Milei é bem mais liberal do que Bolsonaro e este é infinitamente mais conservador do que aquele.
Não podemos esquecer o efeito que o modelo institucional exerce sobre as eleições. O presidencialismo é, cada vez mais um plebiscito entre esquerda e direita. Vence quem fizer mais votos pessoais entre 36 milhões de votantes na Argentina e 150 milhões no Brasil. É muito voto! Esse “plebiscito” se trava em sociedades cada vez mais sequeladas pelos efeitos da Guerra Cultural e nem os Estados Unidos escapam de tal condição. Como consequência, a capacidade de comunicação e o modo como os candidatos lidam com as percepções e sentimentos da população são mais decisivos do que as propostas de governo.
Em 2018, sem dinheiro nem tempo de TV, Bolsonaro derrotou o poder hegemônico e paga caro por esse pecado imperdoável. Milei usou de seus talentos, venceu bem a eleição e certamente enfrentará dificuldades análogas. Bolsonaro não era liberal, mas tinha Paulo Guedes, seu “Posto Ipiranga”. Pôs ordem na casa, mas Lula, antes da posse, já tinha prontos dezenas de projetos para destruir tudo. Veremos como os outros poderes da Argentina, viciados no estatismo, se relacionarão com a motosserra de Milei.
A Ciência Política tem soluções para algumas dessas deformidades institucionais comuns à América Ibérica, embora não para os problemas educacionais e culturais de suas sociedades. Contudo, a Ciência Política não é a Política. Menos ainda a política com “p” minúsculo como eu a deveria ter escrito.