Por Fernanda Estivallet Ritter - Pres. IEE-RS
Já está no ar o reality show em que um grupo de pessoas é vigiado por 24 horas confinado em uma casa, o Big Brother Brasil. O programa, já na 24ª edição, cria celebridades instantâneas, com suas rotinas e tramas comentadas no mundo real e digital. Popularizado como BBB, seu nome tem origem literária, a obra de George Orwell “1984”, na qual o “Grande Irmão” é o governo autoritário que tudo vê e tudo controla.
A distopia de Orwell, publicada em 1949, traz reflexões importantes sobre os rumos de uma sociedade ameaçada pelo autoritarismo, pelo controle sobre o pensamento individual e pela manipulação da verdade. Apesar do futuro assustador projetado pelo autor na ficção, a história ressoa de maneira surpreendente na realidade atual.
A constante vigilância em que os personagens do livro vivem é perturbadora. Assim como no BBB. Porém, no programa os participantes escolhem participar. Na vida real, não há essa opção. Traçando um paralelo com os dias atuais, ainda mais agora, com a inserção da inteligência artificial em nosso cotidiano, até onde teremos nossa individualidade preservada?
No livro, a verdade é constantemente manipulada, e os fatos são alterados conforme o interesse do “Grande Irmão”. Um Orwell contemporâneo faria referências às fake news e à desinformação, além de citar o perigo do controle de narrativas por aqueles que detêm o poder. No romance também nos deparamos com a novilíngua, a linguagem criada pelo Partido para restringir o pensamento crítico, eliminando e modificando as palavras. Vivemos isso atualmente, quando as palavras são ressignificadas e distorcidas.
E o protagonista da trama, Winston Smith, assim como o Selvagem da também distopia “Admirável Mundo Novo”, enfrenta dificuldade na ausência de conexões humanas genuínas e, como consequência, a solidão. Na pressão social para se conformar a normas culturais, ideológicas e políticas, a individualidade e o pensamento crítico sucumbem à uniformidade imposta.
Que o “Grande Irmão” siga apenas no reality show e no romance de décadas passadas. Mas o alerta trazido no livro seguirá atemporal: devemos nos manter vigilantes, denunciando os desmandos daqueles que ameaçam a nossa liberdade individual.
Por Percival Puggina
Mas é infâmia de mais!... Da etérea plaga
Levantai-vos, heróis do Novo Mundo!
Andrada! arranca esse pendão dos ares!
Colombo! fecha a porta dos teus mares.
Castro Alves, Navio Negreiro
As perguntas que farei perturbam meu sono e são comuns ao cotidiano de milhões de cidadãos brasileiros. Como não ser assim, se a nação se dilacera e degenera, o sectarismo se empodera, a burrice impera, o crime prospera, a política se adultera, a Têmis se torna megera e os omissos somem ou dormem? Só eu acordo nas madrugadas pensando nesses motivos pelos quais 41% dos brasileiros (1), entre os quais 55% dos nossos jovens (2), só não desistem do Brasil por não terem condições financeiras de arrancar as folhas de um passado sem esperança e redigir seu futuro noutro lugar?
Os responsáveis por isso conseguem dormir? A nação se inquieta pela apatia de representantes omissos que tanto lhe custam. Como é insignificante, aliás, a relação custo/benefício, somados o mal que fazem e o bem que deixam de fazer! Como conciliam o sono e a culpa? A que destroços, a cupidez e a conveniência pessoal em condomínio com a injustiça reduziram tais almas? Elas simplesmente somem dos plenários quando, da tribuna, algum de seus pares lhes cobra pela apatia e a destruição das instituições!
No entanto, a realidade que vemos é sinistra. O Estado se agiganta perante a sociedade a que deveria servir. A juventude recebe uma educação de qualidade vexatória, últimos lugares nos rankings internacionais do PISA e da OCDE; a cultura nacional está degradada e o próprio QI dos brasileiros, por falta de estímulos, pode estar em regressão. Há décadas, os discípulos de Paulo Freire controlam e tornam cada vez mais sectária a educação nacional, transformando-a numa fábrica de ignorantes miseráveis, com as bênçãos do Estado. Quem escapa dessa máquina de moer cérebros prospera e vira réu no tribunal da desigualdade!
Resultado: chegamos a setenta e cinco milhões de seres humanos dependendo da assistência social do Estado. Do Estado? Sim, sim, o ente causador de todo esse mal aceita sem qualquer constrangimento posar de benfeitor. A pergunta que poucos fazem é: “Se o culpado não for o Estado, quem haveria de ser?”. Certamente a culpa não pode ser imputada a quem decide investir, correr riscos, gerar empregos, pagar salários e ser extorquido com impostos, taxas, contribuições. Essa pergunta derruba século e meio de mentiras sobre os sucessos do socialismo.
Eu quero o meu país de volta! Eu o vi antes, imperfeito, mas humano. Não era uma Suíça, mas era um país amável. O Brasil tinha boa reputação. Hoje é um país de má fama. Eu o quero moderno, mas com aqueles bens do espírito e naquele ânimo nacional que se comoveu e se moveu solidário quando as águas cobriram o abismo no Rio Grande do Sul. Eu quero de volta a energia inusitada que, durante oito anos, saudoso do “meu Brasil brasileiro, mulato inzoneiro”, me levou para cima dos carros de som a verberar corruptos, defender a liberdade e resistir à perdição de uma nação.
Impossível não evocar os versos finais de Navio Negreiro, esbravejados por Castro Alves, se vejo avançar o poder da Casa Grande, a se refestelar em folguedos e extravagâncias, enquanto garroteia direitos de cidadãos outrora livres.
(1)
https://www.cnnbrasil.com.br/politica/polarizacao-politica-41-dos-brasileiros-mudariam-de-pais-se-pudessem-diz-quaest/
(2)
https://g1.globo.com/economia/midia-e-marketing/noticia/2022/08/17/55percent-dos-jovens-brasileiros-deixariam-o-pais-se-pudessem-diz-pesquisa.ghtml