Por Percival Puggina
Compreender para resolver. É disso que se trata.
Faça o seguinte: espalme as duas mãos e abra os dedos; em seguida, aproxime as mãos e junte-as, cruzando os dedos; feche os dedos. Você tem diante dos olhos um perfeito símbolo de unidade. E, devo complementar, uma representação visual do que acontece no Brasil enquanto a política se judicializa e a justiça se politiza.
O senador Randolfe Rodrigues é, apenas, a expressão mais simples do primeiro fenômeno, que ganhou crescente expressão no país: a política sendo feita mediante o STF (ou TSE), fora do parlamento e fora da sociedade. Por outro viés, a sequência de palavras e obras, ações e omissões dos tribunais superiores intervindo com regularidade no cotidiano da política representam o segundo fenômeno. Para o quadriênio recém-iniciado, o petismo alcançou a plenitude dessa unidade.
Lembremos. A oposição ao governo Jair Bolsonaro nunca foi obra parlamentar do petismo. As investigações conduzidas pela força-tarefa da Lava Jato esfarelaram a credibilidade do partido que recolheu as unhas da tradicional agressividade. A oposição, ferrenha oposição, foi conduzida pela imprensa e pelo STF. Era do Supremo o protagonismo, de lá vinha o noticiário político. Estrategicamente, os principais líderes petistas, mesmo os de ficha limpa, sumiram da pauta parlamentar. Nada disso tem paralelo na história republicana. Nunca os derrotados mandaram tanto no país por via indireta.
Lembre de tudo que você leu, viu e ouviu sobre discurso de ódio e gabinete de ódio. Observe que toda essa malhação teve como foco manifestações recolhidas nas cada vez mais patrulhadas e menos significativas redes sociais. Depois, compare isso com o que desde a eleição de Lula povoa os discursos oficiais, as entrevistas, e as ações concretas dos donos do poder.
Estimados leitores. De nada vale chorar o leite derramado. O céu não vai se abrir; o Altíssimo não vai empalmar as rédeas do Brasil e de nada vale esbofetear os fatos. Está mais do que provado: as redes sociais, mesmo que não estivessem controladas, por sua dispersão e deficiências técnicas perderiam para o poder de comunicação cotidiano das milícias jornalísticas empresariais.
Nós somos a razão de nossa esperança ou desespero. Eu jogo no primeiro time. Sei que no sulco aberto pela Lava Jato o ceguinho conservador e liberal achou um vintém. Quase um acaso! Agora é arregaçar mangas, deixar cair as escamas dos olhos e, como Paulo, infiltrar o coração do Império. Criar movimentos, promover eventos, motivar lideranças, formar líderes (especialmente líderes jovens), criar partido de direita (sem extrema direita e sem centristas), mobilizar instituições privadas, infiltrar instituições públicas, entrar nas universidades, enfrentar o sistema dentro do sistema, apoiar nossa maioria na Câmara dos Deputados, eleger em 2024 nossos vereadores e prefeitos, diminuir a influência dos partidos do Centrão para reduzir o balcão dos negócios e o número dos negocistas (são eles que nos derrotam no Senado). Centro direita e centro são pura enganação.
Lembrete final: não adianta chutar o balde; o leite já derramou.
Por Percival Puggina
Mas é infâmia de mais!... Da etérea plaga
Levantai-vos, heróis do Novo Mundo!
Andrada! arranca esse pendão dos ares!
Colombo! fecha a porta dos teus mares.
Castro Alves, Navio Negreiro
As perguntas que farei perturbam meu sono e são comuns ao cotidiano de milhões de cidadãos brasileiros. Como não ser assim, se a nação se dilacera e degenera, o sectarismo se empodera, a burrice impera, o crime prospera, a política se adultera, a Têmis se torna megera e os omissos somem ou dormem? Só eu acordo nas madrugadas pensando nesses motivos pelos quais 41% dos brasileiros (1), entre os quais 55% dos nossos jovens (2), só não desistem do Brasil por não terem condições financeiras de arrancar as folhas de um passado sem esperança e redigir seu futuro noutro lugar?
Os responsáveis por isso conseguem dormir? A nação se inquieta pela apatia de representantes omissos que tanto lhe custam. Como é insignificante, aliás, a relação custo/benefício, somados o mal que fazem e o bem que deixam de fazer! Como conciliam o sono e a culpa? A que destroços, a cupidez e a conveniência pessoal em condomínio com a injustiça reduziram tais almas? Elas simplesmente somem dos plenários quando, da tribuna, algum de seus pares lhes cobra pela apatia e a destruição das instituições!
No entanto, a realidade que vemos é sinistra. O Estado se agiganta perante a sociedade a que deveria servir. A juventude recebe uma educação de qualidade vexatória, últimos lugares nos rankings internacionais do PISA e da OCDE; a cultura nacional está degradada e o próprio QI dos brasileiros, por falta de estímulos, pode estar em regressão. Há décadas, os discípulos de Paulo Freire controlam e tornam cada vez mais sectária a educação nacional, transformando-a numa fábrica de ignorantes miseráveis, com as bênçãos do Estado. Quem escapa dessa máquina de moer cérebros prospera e vira réu no tribunal da desigualdade!
Resultado: chegamos a setenta e cinco milhões de seres humanos dependendo da assistência social do Estado. Do Estado? Sim, sim, o ente causador de todo esse mal aceita sem qualquer constrangimento posar de benfeitor. A pergunta que poucos fazem é: “Se o culpado não for o Estado, quem haveria de ser?”. Certamente a culpa não pode ser imputada a quem decide investir, correr riscos, gerar empregos, pagar salários e ser extorquido com impostos, taxas, contribuições. Essa pergunta derruba século e meio de mentiras sobre os sucessos do socialismo.
Eu quero o meu país de volta! Eu o vi antes, imperfeito, mas humano. Não era uma Suíça, mas era um país amável. O Brasil tinha boa reputação. Hoje é um país de má fama. Eu o quero moderno, mas com aqueles bens do espírito e naquele ânimo nacional que se comoveu e se moveu solidário quando as águas cobriram o abismo no Rio Grande do Sul. Eu quero de volta a energia inusitada que, durante oito anos, saudoso do “meu Brasil brasileiro, mulato inzoneiro”, me levou para cima dos carros de som a verberar corruptos, defender a liberdade e resistir à perdição de uma nação.
Impossível não evocar os versos finais de Navio Negreiro, esbravejados por Castro Alves, se vejo avançar o poder da Casa Grande, a se refestelar em folguedos e extravagâncias, enquanto garroteia direitos de cidadãos outrora livres.
(1)
https://www.cnnbrasil.com.br/politica/polarizacao-politica-41-dos-brasileiros-mudariam-de-pais-se-pudessem-diz-quaest/
(2)
https://g1.globo.com/economia/midia-e-marketing/noticia/2022/08/17/55percent-dos-jovens-brasileiros-deixariam-o-pais-se-pudessem-diz-pesquisa.ghtml