Por Dagoberto Lima Godoy, advogado, ex-presidente da Fiergs
Além do governo em guerra contra o Banco Central, empresários e suas entidades insistem em reclamar contra os juros altos (entenda-se, contra a taxa básica ou Selic). Perfeitamente compreensível, tendo em vista o obstáculo que os custos financeiros representam para o desenvolvimento de seus negócios. Quando tive mandato para falar em nome dos industriais gaúchos também muito critiquei a então chamada “âncora dos juros”, mas sempre associei o reclamo à necessidade de eliminar a causa do problema, ou seja, a falta das indispensáveis reformas institucionais e o excesso de gastos governamentais.
Hoje, diante de um governo que explicita sua volúpia gastadora, colocando isso às claras no tal de “arcabouço fiscal”, mais do que nunca se faz imperioso apontar a falácia de políticas fiscais que não levam a sério, para dizer o mínimo, os riscos inflacionários e os males que a desvalorização da moeda causa, especialmente às pessoas de menos posses. Há que se apontar o exemplo da Argentina, em suas recidivas de descontrole monetário, bem como recordar o desastre da “nova matriz econômica” do governo Dilma, e os consequentes desastres econômicos. Não fossem suficientes essas amargas experiências, basta sentir na carne as dificuldades que hoje nos assolam, em decorrência da enxurrada de dinheiro que os governos do mundo todo utilizaram para compensar as estratégias do “fique em casa,” que paralisaram e desorganizaram a economia mundial.
Maldizer os juros altos tem sua inegável razão, mas quando rondam o ministério da economia eflúvios de uma tal TMM (Teoria Monetária Moderna), que consagra déficits sem limite, os reclamos deveriam, mais que nunca, vir sempre acompanhados pelas justas denúncias dos desmandos perdulários de um estado sem freios fiscais e -- ai de nós -- sem contrapeso de poderes.
Por Percival Puggina
Mas é infâmia de mais!... Da etérea plaga
Levantai-vos, heróis do Novo Mundo!
Andrada! arranca esse pendão dos ares!
Colombo! fecha a porta dos teus mares.
Castro Alves, Navio Negreiro
As perguntas que farei perturbam meu sono e são comuns ao cotidiano de milhões de cidadãos brasileiros. Como não ser assim, se a nação se dilacera e degenera, o sectarismo se empodera, a burrice impera, o crime prospera, a política se adultera, a Têmis se torna megera e os omissos somem ou dormem? Só eu acordo nas madrugadas pensando nesses motivos pelos quais 41% dos brasileiros (1), entre os quais 55% dos nossos jovens (2), só não desistem do Brasil por não terem condições financeiras de arrancar as folhas de um passado sem esperança e redigir seu futuro noutro lugar?
Os responsáveis por isso conseguem dormir? A nação se inquieta pela apatia de representantes omissos que tanto lhe custam. Como é insignificante, aliás, a relação custo/benefício, somados o mal que fazem e o bem que deixam de fazer! Como conciliam o sono e a culpa? A que destroços, a cupidez e a conveniência pessoal em condomínio com a injustiça reduziram tais almas? Elas simplesmente somem dos plenários quando, da tribuna, algum de seus pares lhes cobra pela apatia e a destruição das instituições!
No entanto, a realidade que vemos é sinistra. O Estado se agiganta perante a sociedade a que deveria servir. A juventude recebe uma educação de qualidade vexatória, últimos lugares nos rankings internacionais do PISA e da OCDE; a cultura nacional está degradada e o próprio QI dos brasileiros, por falta de estímulos, pode estar em regressão. Há décadas, os discípulos de Paulo Freire controlam e tornam cada vez mais sectária a educação nacional, transformando-a numa fábrica de ignorantes miseráveis, com as bênçãos do Estado. Quem escapa dessa máquina de moer cérebros prospera e vira réu no tribunal da desigualdade!
Resultado: chegamos a setenta e cinco milhões de seres humanos dependendo da assistência social do Estado. Do Estado? Sim, sim, o ente causador de todo esse mal aceita sem qualquer constrangimento posar de benfeitor. A pergunta que poucos fazem é: “Se o culpado não for o Estado, quem haveria de ser?”. Certamente a culpa não pode ser imputada a quem decide investir, correr riscos, gerar empregos, pagar salários e ser extorquido com impostos, taxas, contribuições. Essa pergunta derruba século e meio de mentiras sobre os sucessos do socialismo.
Eu quero o meu país de volta! Eu o vi antes, imperfeito, mas humano. Não era uma Suíça, mas era um país amável. O Brasil tinha boa reputação. Hoje é um país de má fama. Eu o quero moderno, mas com aqueles bens do espírito e naquele ânimo nacional que se comoveu e se moveu solidário quando as águas cobriram o abismo no Rio Grande do Sul. Eu quero de volta a energia inusitada que, durante oito anos, saudoso do “meu Brasil brasileiro, mulato inzoneiro”, me levou para cima dos carros de som a verberar corruptos, defender a liberdade e resistir à perdição de uma nação.
Impossível não evocar os versos finais de Navio Negreiro, esbravejados por Castro Alves, se vejo avançar o poder da Casa Grande, a se refestelar em folguedos e extravagâncias, enquanto garroteia direitos de cidadãos outrora livres.
(1)
https://www.cnnbrasil.com.br/politica/polarizacao-politica-41-dos-brasileiros-mudariam-de-pais-se-pudessem-diz-quaest/
(2)
https://g1.globo.com/economia/midia-e-marketing/noticia/2022/08/17/55percent-dos-jovens-brasileiros-deixariam-o-pais-se-pudessem-diz-pesquisa.ghtml