CUSTO DE FAZER
Conforme prometi volto ao tema iniciado no editorial de ontem para concluir a leitura que fiz sobre as propostas apresentadas pelo economista Eduardo Gianetti da Fonseca, consultor da candidata Marina da Silva. - Para colocar a situação fiscal do país em ordem, e produzir superávits fiscais necessários para se restabelecer a confiança e a sustentabilidade das contas públicas, Gianetti, acertadamente, afirma que há um custo de fazer o ajuste hoje. Mas, certamente, é bem menor do que o de não fazê-lo.
LASTRO
A diferença fundamental é você estar enfrentando uma dificuldade que é legitima porque restabelece um horizonte de volta ao crescimento versus estar enfrentando uma situação de dificuldade sem nenhuma perspectiva de reconquistar a confiança e um horizonte de normalização. São as duas coisas que estão em jogo hoje no Brasil: não se pode contar só com o choque de confiança. Ele é parte importante e ele vai ser ainda mais importante se vier acompanhado de um movimento crível de que as coisas voltaram a se direcionar no caminho certo. A confiança é fundamental, mas precisa ter lastro.
DESEMPREGO
Quanto ao fato de que esse ajuste proporcionaria desemprego e queda de renda, Gianetti disse: - o desemprego já é uma realidade. E a ideia é que termine o quanto antes. Não está nos planos de ninguém fazer ajuste recessivo. Não é disso que se trata. Se trata de restabelecer a confiança e mostrar que a economia voltou a um bom caminho. A experiência mostra que a capacidade de resposta da sociedade brasileira é muito forte. Tendo a crer que ainda em 2015 será possível ver a volta da economia ao crescimento, se for muito bem feito.
VÁRIOS ORÇAMENTOS
Os compromissos se distribuem no tempo, assevera Gianetti. - É um erro grave imaginar que o que está colocado no programa vai se materializar no primeiro orçamento. Não será o caso. É preciso construir condições adequadas para que isso possa acontecer ao longo do mandato.Pela revisão das prioridades no orçamento, o que inclui -desonerações, subsídios explícitos e ocultos- que hoje estão prejudicando muito esses compromissos de caráter mais social. Vai depender da evolução da arrecadação, à medida que a economia for retomando, vai depender do PIB, vai depender da gestão, de reduzir o desperdício.
CRÉDITO
Quanto ao crédito, Gianetti está convencido de que há uma extravagância muito grande na expansão do crédito subsidiado no Brasil. Não proponho um choque, porque teria um efeito traumático e ninguém quer isso, mas vai ter que rever essa política extravagante que levou a uma expansão de 9% do PIB na oferta de crédito subsidiado financiado com dívida pública. O problema é que o governo Dilma levou ao limite o uso desse tipo de -funding- para que o BNDES escolha campeões nacionais e transfira recursos do contribuinte em subsídios para seus parceiros, que são grandes empresas que poderiam se financiar no mercado de crédito ou com lucros retidos ou no mercado internacional.
BENDES: REMÉDIO-VENENO
O BNDES é um típico caso de remédio-veneno. Ele tolheu o mercado de capitais, distorceu o mercado de crédito, prejudicou a política do Banco Central de aperto monetário, fora a falta de transparência, que é gravíssima no estado de direito. Não é nenhum problema manter subsídio no estado de direito, mas é uma regra de ouro que ele seja explícito e passe pelo orçamento. Do modo como ele está sendo feito no BNDES ele é oculto, ele não foi negociado e ele está transferindo para grupos privilegiados recursos da sociedade brasileira. Isso é política parafiscal.
OPERAÇÃO DESMAME
Quanto à política industrial, Gianetti arrematou: a indústria deve se preparar para uma operação desmame. Ela está acostumada a chorar e ser atendida. Ela vai ter que se acostumar a uma situação em que ela será vitoriosa se for bem na competição. E ela irá bem na competição de mercado se for eficiente e inovadora. Temos que sair da situação -viciada- em que vale mais a pena para uma empresa ter uma boa rodada de negociação em Brasília, para uma situação em que vale a pena para ela concentrar sua atenção e seus esforços em fazer melhor o que ela faz ou em fazer algo que ninguém está fazendo.É necessário integrar mais a economia brasileira, fazer uma nova rodada de abertura comercial, de mais integração competitiva, e dar para o empresário a confiança de que as regras são permanentes e não vão ser negociadas de maneira arbitrária na base da pressão setorial. Elas valem para todos, serão horizontais e visam ao aprimoramento do ambiente de negócios. No governo Dilma houve um retrocesso para um modelo de microgerenciamento, que gerou uma espiral intervencionista no Brasil.Quanto ao que diferencia o projeto da Marina dos demais, Gianetti disse que não vemos a economia como um fim em si mesmo. Ela é pré-condição para uma vida melhor para todos, de uma realização mais plena. O sonho que nos move é que a economia deixe de ocupar o lugar de proeminência que ela ocupa hoje no debate brasileiro para que a gente possa focar em questões ligadas à cidadania, à realização humana, à felicidade.