O déficit primário das contas federais em 2024, apresentado nos demonstrativos do Tesouro Nacional e o considerado para efeito do arcabouço fiscal estão longe da realidade. Porém, antes de tratarmos da arrecadação de 2024, fazemos, por necessário, um histórico do que aconteceu em 2023.
Em 2023 o déficit primário foi deR$ 228,5 bilhões ou 2,4% PIBe o limite mínimo do arcabouço fiscal era um déficit de R$ 82 bilhões ou 0,75% PIB. Como este limite fora ultrapassado em muito, e não tendo como cumpri-lo, o governo fez uma manobra contábil, carregando ainda mais o exercício de 2023 com despesas que seriam de 2024, mediante a antecipação de pagamento de precatórios na ordem de R$ 40 bilhões, uma espécie de pedalada fiscal às avessas. Com isso, qualquer comparação dos exercícios, como é feita pelo governo, é enganosa.
Então, o déficit de 2023 foi principalmente fruto da PEC da transição, também conhecida como da “gastança”, e da antecipação de despesas do exercício seguinte.
Em 2024 o déficit foi de R$ 43 bilhões, mas foram excluídas as despesas relativas às enchentes do Rio Grande do Sul e outras, em torno de R$ 32 bilhões. Com isso, o déficit considerado para efeito de arcabouço foi de R$ 11 bilhões, ficando dentro de meta, que era déficit de R$ 29,5 bilhões. Na realidade, o déficit real foi R$ 85 bilhões, sem as exclusões e antecipações dos precatórios, citadas.
Em 2024, houve grande crescimento da arrecadação, na ordem de R$ 326 bilhões, ou 13,9% nominais ou 9% reais, sobre o ano anterior. As receitas administradas pela Receita Federal aumentaram R$ 250,7 bilhões, 17,4% nominais ou 12,5% reais, três vezes a inflação (4,83%), uma verdadeira “derrama fiscal”.
O Imposto de Importação aumentou 43,4% nominais ou 37,1% reais; o IPI, 42,2% e 36,2% reais. O principal tributo federal, o Imposto de Renda, aumentou 12,8% nominais e 8,1% reais. O COFINS aumentou 25,4% e 20,2%, respectivamente. O PIS/PASEP, 22,6% e 17,5%.
Das receitas não administradas pela Receita Federal destacam-se dividendos e participações com 44,9% nominais e 38% reais. Todos esses números são do Boletim do Tesouro Nacional, de dezembro/2024.
O governo precisa saber que, enquanto ficar fazendo manobras fiscais sem buscar um superávit primário que estabilize o crescimento da dívida com o do PIB, nosso destino será o pior possível.
Por Roderick Navarro, político venezuelano exilado no Brasil desde 2017 por ordem de arresto do régime de Nicolás Maduro.
Nos regimes autoritários, a censura não é um erro: é o primeiro tijolo de uma engrenagem construída para esmagar a dissidência. Onde há censura, há perseguição. Onde há perseguição, há tortura. Os tiranos, obcecados em se manter no poder, não se contentam em ocupar o trono: acreditam ser deuses. Proclamam-se justos, infalíveis, a voz do povo. Mas, para sustentar essa fantasia divina, precisam silenciar aqueles que gritam a verdade: que o rei está nu.
A censura precisa de executores. No Brasil, esse papel tem sido assumido, com frequência preocupante, por juízes e autoridades que se arrogam o poder de decidir o que é verdade e o que é mentira, o que é permitido e o que é perigoso. As instituições, que deveriam proteger os cidadãos, tornam-se instrumentos de repressão a serviço do poder. Um exemplo recente é a ordem do Supremo Tribunal Federal (STF), em janeiro de 2025, que bloqueou as redes sociais da Revista Timeline — fundada pelos jornalistas Luís Ernesto Lacombe e Allan dos Santos — sem qualquer explicação pública clara. As contas da revista no X, Instagram e YouTube foram removidas. Lacombe denunciou o episódio como um ataque à democracia: “Por quê? Não disseram. Que bela democracia temos…”
Outro caso alarmante foi a cassação do mandato da deputada federal Carla Zambelli, também em janeiro de 2025, pelo Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, após ela questionar o sistema eleitoral. Mais de 946 mil votos foram anulados. O senador Jorge Seiff classificou a decisão como uma “perseguição clara, óbvia e absurda” contra a direita. E esses não são casos isolados: o exílio do jornalista Oswaldo Eustáquio, perseguido por denunciar abusos de poder, e o bloqueio do X no Brasil em 2024 por ordem judicial — sob a acusação de permitir “desinformação” — são sinais de uma censura que já não choca: está se normalizando.
No início, silenciar alguns poucos é suficiente para intimidar muitos. Mas em sociedades onde ainda há quem ouse falar, a censura seletiva torna-se insuficiente. Então o regime avança: não cala apenas alguns, cala todos. No Brasil, vozes da resistência têm denunciado essa escalada autoritária, mas os tiranos possuem uma arma ainda mais eficiente do que a censura: a economia. Como advertiu o economista Roberto Campos, defensor do liberalismo e crítico feroz do autoritarismo: “A liberdade morre quando o Estado controla os meios de produção e as mentes.” Campos, que combateu a burocracia e o intervencionismo, alertou sobre o perigo de um Estado que sufoca a liberdade econômica para dominar a sociedade.
E é isso que vemos hoje: aumento dos gastos públicos, impostos sufocantes, desvalorização da moeda e obstáculos crescentes ao empreendedorismo. Quando as necessidades básicas — comida, moradia, segurança — estão ameaçadas, a liberdade de expressão vira luxo. O cidadão, exausto pela luta diária, esquece o dissidente preso.
A censura, no entanto, não é o fim, mas o meio. É a antessala da violência cruel e impiedosa. Uma vez desmobilizada a oposição, o regime avança para a perseguição em massa: um preso político torturado, um líder exilado, uma família encarcerada pelas ideias de um dissidente… No Brasil, a normalização dessas práticas representa uma ameaça concreta. Segundo o World Justice Project, em 2025 o país ocupava a 80ª posição entre 142 nações em imparcialidade judicial — à frente apenas da Venezuela. Quando a justiça se politiza, a censura não é um instrumento de “proteção institucional”: é uma arma contra os opositores.
Essa estratégia, herdeira das piores tradições leninistas, só pode ser derrotada pela força de um povo organizado. Uma cidadania ativa, disposta a apoiar líderes corajosos, pode frear a tirania. Mas se a censura avança, a economia colapsa e a resistência se fragmenta, o futuro será sombrio. Os líderes da oposição acabarão reduzidos a migalhas de poder ou, pior ainda, na prisão ou no exílio.
O Brasil está diante de uma encruzilhada. A censura não é apenas um ataque à imprensa ou aos políticos da oposição: é um ataque a toda a sociedade. As forças políticas — dos partidos aos movimentos civis — não podem cruzar os braços nem assistir, passivamente, ao povo se degradar enquanto fecham “acordos”. Tiranos gostam de escrever o desfecho das histórias. Resta torcer para que, desta vez, não o façam com o sangue dos brasileiros.