Por Roberto Rachewsky
A América Latina é pródiga na produção de ditadores. Tiranos que usam a força para a tomada de poder ou manipulam as instituições, ou o povo, para aparentar que suas decisões autoritárias são democráticas. Bem, democracia e ditadura sempre andaram de mãos dadas, estando a primeira a serviço da segunda.
Não se sabe se foi Getúlio Vargas ou Oscar Benevidez, ditador peruano, quem parafraseou Maquiavel, que teria dito: “Aos amigos, os favores. Aos inimigos, a lei”,incorporando a infinitude do poder majestático, para dizer: “Aos amigos, tudo. Aos inimigos, a lei”.
Ora, quem temeria sofrer o rigor da lei, senão aqueles que sabem como as lei são feitas quando quem está no poder é um ditador. O que caracteriza uma ditadura é o grau extremo de subjetividade da lei. A ditadura máxima, absolutista e totalitária, é aquela na qual quem detém o poder nas mãos se confunde com o próprio Estado e faz da lei o que bem entender.
Quando a lei emana do tirano, sua subjetividade transforma o contexto social num ambiente anárquico, caótico. A insegurança jurídica se instala e o governo se torna uma ameaça concreta e constante contra a sociedade, como se fosse uma máfia.
Nunca tivemos no Brasil o Império da Lei. Em nenhum momento, conhecemos na prática os pilares que caracterizam o capitalismo.
A livre iniciativa, que significa poder agir de acordo com o próprio julgamento para criar os valores que cada um achar necessário para realizar propósitos e conquistar a felicidade, aqui, é uma concessão estatal podendo ser cassada arbitrariamente.
Propriedade privada, que significa poder dispor do que é seu como bem entender, sem correr o risco de ser despojado à força do fruto do seu trabalho mental ou físico, é relativizada por um inexistente fim social.
Estado de Direito, leis objetivas que têm como finalidade precípua proteger os direitos individuais inalienáveis que todos os homens de bem procuram manter intactos, para si e para os outros, é só uma aspiração ideal.
Na realidade, estamos nas mãos de ditadores, eleitos democraticamente ou não. Suas leis subjetivas não são iguais para todos, privilegiam os amigos, aqueles que, para apoiarem os poderosos, usufruem imoralmente de benesses que lhe são oferecidas em detrimento de quem produz para sustentá-las, tendo o que é seu, a liberdade, a propriedade, a felicidade e até a vida, tomadas, da noite para o dia.
Somos uma sociedade vulgar. “Aos amigos, tudo. Aos demais, uma lei qualquer”.
Por Percival Puggina
Estava imaginando o que passou pela cabeça de um cidadão cubano quando tomou conhecimento da lista de convênios que Lula e sua comitiva assinaram com o governo de seu país na recente visita a Havana, espécie de Jerusalém do comunismo decrépito.
Há alguns anos, época em que muito debati com representantes dos partidos de esquerda, em especial membros de um muito ativo movimento de solidariedade a Cuba, ouvi deles que no Brasil existem miseráveis ainda mais miseráveis do que em Cuba. Eu os contestava dizendo que ninguém desconhecia a pobreza existente aqui, mas era preciso observar uma diferença essencial entre a situação nos dois países. Aqui, os pobres convivem com carências alimentares por falta de meios para adquirir alimentos; em Cuba, mesmo que o povo dispusesse dos meios, não teria o que adquirir porque a economia comunista, como se sabe, é improdutiva.
Esse é um dos motivos, dentre muitos outros, para que ninguém caia na balela de que o comunismo é bom para “acabar com a pobreza”. O que aconteceu com o setor açucareiro dá excelente exemplo. No final dos anos 1960, a URSS se dispôs a comprar 13 milhões de toneladas anuais de açúcar cubano, a partir da safra 1969/1970. O país produzia entre três e quatro milhões de toneladas, com tendência decrescente. Muitas atividades da ilha foram suspensas e comunistas do mundo todo foram trabalhar naqueles canaviais. Conseguiram sete milhões de toneladas.
Trinta anos mais tarde, quando fui a Cuba pela segunda vez, a safra 2002/2003 fora tão escassa que Cuba importava açúcar! Depois, a produção andou pela casa dos dois milhões de toneladas e no ano passado bateu em meio milhão. A história do açúcar é a história da balança comercial e do consequente déficit cambial cubano. Daí o pagamento não em dólares, mas em charutos ou “outras moedas” ... Daí também o motivo pelo qual, se você excluir estrangeiros residentes, turistas, membros da elite partidária e militar, a carência é generalizada.
Imagine então um cidadão cubano sendo informado pelos órgãos de divulgação do estado de que seu país firmara acordo com o Brasil sobre trocas de tecnologia e de cooperação técnica em agricultura, pecuária, agroindústria, soberania e segurança alimentar e nutricional, mudas, bioinsumos e fertilizantes, agricultura de conservação, agricultura urbana e periurbana; produtos alimentares prioritários para consumo humano e animal, reprodução de espécies agroalimentares prioritárias; uso eficiente da água, cadastro e gestão da terra e abastecimento agroalimentar. E mais biotecnologia, bioeconomia, biorrefinarias, biofabricação, energias renováveis, ciências agrárias, clima, sustentabilidade, redes de ensino e pesquisa (*).
Não sei se está previsto, mas se em tudo isso e em outros convênios também firmados, não ligados à produção de alimentos, o Brasil enviar cheque, pode escrever aí: vem charuto.
*Condensado de matéria da Agência Brasil – EBC, íntegra em https://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2023-09/brasil-assina-acordos-de-cooperacao-em-varios-setores-com-cuba.