Espaço Pensar +

ECONOMIA EM XEQUE - 22.09.2020


Texto do pensador Marcio Coimbra, publicado no jornal O Tempo de ontem, 21/9.

 

Na medida que cresce a popularidade de Bolsonaro, crescem também os GASTOS PÚBLICOS da rede de proteção social iniciada pela pandemia. O chamado “auxílio emergencial” foi essencial para que os números presidenciais galgassem pontos importantes nas pesquisas de opinião. A reversão desta popularidade, entretanto, será uma realidade na medida que os efeitos da pandemia se impuserem na economia.

O plano era rebatizar o Bolsa Família de Renda Brasil e turbiná-lo com recursos, carimbando o principal programa assistencial brasileiro com uma marca que remete ao governo atual. O mesmo plano que já foi iniciado com o “Minha Casa, Minha Vida”, que passou a se chamar “Casa Verde Amarela” e o PAC, Programa de Aceleração do Crescimento, repaginado como “Pró-Brasil”.

 

No caso do Renda Brasil, o problema é mais profundo. Falta ao governo, até o momento, encontrar mecanismos para financiá-lo. O auxílio emergencial durante a pandemia, que distribui R$ 600 mensais, se tornou um programa de R$ 51 bilhões/mês para algo como 60 milhões de pessoas. Para efeito de comparação, o Bolsa-Família custa R$ 3 bilhões/mês para pagamentos a 14 milhões de famílias.

 

Se o auxílio emergencial se transformasse no Renda Brasil,  custaria R$ 612 bilhões por ano. Se cortado pela metade, ou seja, se fosse de R$ 300 mensais, ainda assim custaria R$ 306 bilhões/ano, praticamente 10 vezes o Bolsa Família/ano e o mesmo valor do total de gastos de custeio e investimentos do Orçamento federal. Um projeto inviável.

 

O governo tentou meios de custear este auxílio com outras fontes, o que causou a ira do presidente Bolsonaro com a equipe econômica, sepultando inclusive o nome do programa. O Renda Brasil, desta forma, morreu sem jamais ter nascido, mas o problema de uma popularidade turbinada por um auxílio que tem data para acabar preocupa o Planalto.

 

O impacto da diminuição do valor do auxílio pode erodir a popularidade do Presidente em pouco tempo, especialmente porque não existe um plano claro de transformação do mecanismo em programa de transferência de renda, tampouco recursos para operar este movimento. A situação é grave.

 

Hoje o número de beneficiários do auxílio emergencial é maior que o de trabalhadores com carteira assinada em 25 Estados brasileiros. Para cada trabalhador com carteira assinada, há quase dois recebendo o benefício. As pessoas recebendo o auxílio já correspondem a 68% dos 96,1 milhões da força de trabalho. No Maranhão, por exemplo, há cinco pessoas recebendo o benefício para cada empregado com carteira. Isto explica que o tombo na economia pode não ser tão grande este ano, mas escancara o fato de que (sem auxílio) o pior está por vir.

 

É preciso entender que a recuperação brasileira será muito mais lenta e dolorosa que se imagina. Nossa economia, que nunca foi robusta, sofreu um enorme abalo com a pandemia e diante do corte do auxílio emergencial, irá encarar a realidade somente no ano que vem. Sem recursos ou reformas, com economia desarrumada e refém de um déficit recorde, o Brasil tem muito que se preocupar, assim como Bolsonaro. Diante desse cenário, não há narrativa que sustente sua popularidade e garanta sua reeleição.


Leia mais  

Como é a vida fora da "reserva ecológica do funcionalismo" público - 18.09.2020


         Eis o ótimo texto do jornalista J. R. Guzzo - publicado ontem na Gazeta do Povo

 

 

 Todos os dias, ou quase isso, o público recebe provas e contraprovas de que há dois Brasis vivendo no mesmo espaço, na mesma época e sob a mesma Constituição, mas com direitos diferentes entre os seus habitantes. Uns são cidadãos de primeira classe; formam cerca de 5% da população e têm empregos na máquina do Estado. Os outros 95% são de segunda classe; têm de sobreviver à custa do seu próprio esforço e pagam pelo sustento, pelos benefícios, pelos privilégios e pela segurança dos primeiros. Sua vida, entre outras coisas, é muito mais arriscada.

 

O mais recente demonstrativo dessa realidade é o que está acontecendo com os funcionários da Volkswagen em São Paulo e no Paraná. Ninguém pode nem sequer pensar, por dois minutos que seja, em congelar os salários do funcionalismo. Não se trata de reduzir, mesmo com redução de horas trabalhadas, e muito menos de mandar alguém embora – trata-se apenas e tão somente de não aumentar os salários, e assim mesmo só por um período limitado de tempo, enquanto durar a devastação econômica da Covid-19. Não pode: a lei não deixa, mesmo porque isso aí é ideia “fascista, contra a democracia e contra as instituições”.

 

Já os sindicatos de trabalhadores da Volkswagen, cujos associados fazem parte dos 95% de cidadãos de segunda categoria mencionados acima, acabam de aceitar uma proposta para ganhar menos em troca de uma garantia temporária de emprego.

 

Ao contrário dos sindicatos de professores públicos (que, por sinal, ameaçam fazer greve contra a reabertura das escolas), de juízes de direito, de empregados dos correios, etc. etc. etc, as organizações de cidadãos privados não se podem dar ao luxo de escolher suas condições de trabalho; vivem no mundo real da economia, e adaptar-se a ele é uma questão de sobrevivência. Não têm quem pague os seus boletos, nem garanta os seus empregos até a aposentadoria, com vencimentos integrais.

 

A Volkswagen, que já teve na casa dos 40 mil funcionários aqui no Brasil, está hoje com 15 mil, por conta do avanço da automação e de condições de mercado. Pode ainda cortar um terço disso. Também não tem escolha: ou reduz ou vai à falência, num país que já produziu mais de 3,7 milhões de veículos num ano, menos de 20 anos atrás, e que em 2019 ficou abaixo de 3 milhões de unidades.

 

Esta é a vida como ela é, no Brasil que vive fora da reserva ecológica do funcionalismo público, protegida por todas as leis e por todos os direitos.


Leia mais  

Jornalistas desprezam Bolsonaro e evangélicos, mas fingem imparcialidade - 17.09.2020


Texto do pensador Rodrigo Constantino, publicado na Gazeta do Povo.

 

 

O assunto era sobre a lentidão e os péssimos serviços do INSS, com suas filas cansativas, e o jornalista da velha guarda conseguiu culpar o governo Bolsonaro e ainda meter os religiosos no meio, dizendo que só igrejas contam com a boa vontade do presidente. Vai ver antes de Bolsonaro era tudo uma maravilha, não é mesmo?

 

Esse jornalista, na hora de comentar a melhoria dos indicadores de ensino pelo Ideb, alegou que é muito cedo para creditar isso ao atual governo. Qual a coerência? Num caso, o problema de décadas é responsabilidade do presidente, e no outro, um estrago de décadas que apresenta alguma melhora não tem qualquer mérito do atual governo?

 

Menciono esse caso pois o comportamento desse jornalista se espalha por boa parte da mídia. A má vontade em relação a Bolsonaro é evidente, o preconceito elitista contra evangélicos é visível, mas eles insistem numa narrativa de que são imparciais, mascarando o escancarado viés de esquerda.

 

Esse mesmo jornalista, em 2002, considerava Lula alguém com "capacidade de liderança, autoridade, coragem, visão etc". Não há, porém, um só elogio ao presidente atual, um reconhecimento de virtude, e mesmo quando é para elogiar algum ministro, a contragosto, diz que é bom "apesar" do chefe, que escolheu todos os ministros.

 

Quando expus a incoerência num debate ao vivo, o jornalista em questão ficou nervoso e partiu para ofensas pessoais. Disse que sou "capacho" do presidente, que sou desonesto, mau caráter ou analfabeto funcional. Os rótulos e ataques expõem a falta de argumentos e a revolta com a verdade exposta.

 

Ele alegou que não é adivinho e por isso achava que Lula era bom, sendo que bastava fazer análise de fato e ver a ação do PT no Rio Grande do Sul para prever o caos. Meu livro contra o petismo foi escrito antes de estourar o escândalo do mensalão, e o primeiro capítulo já mostra como a bandeira ética estava totalmente esgarçada, era fajuta; mas ele finge, ao mesmo tempo, ter bola de cristal e ler mentes quando infere quais as intenções que vão no fundo da mente e do coração de Bolsonaro, imputando sempre as piores causas para cada fala e atitude do presidente. É tanta obsessão que é capaz de Bolsonaro ser culpado até pelo incêndio na Califórnia!

 

Juro que entendo a revolta dessa patota do selo azul comigo. O sujeito cultiva por décadas a imagem de jornalista totalmente imparcial, científico, focado apenas nos fatos e acima de ideologias, chega a acreditar nessa imagem idealizada, até porque cada um bajula o outro da patota no pior estilo corporativista, aí vem um "forasteiro" que nem jornalista é e esfrega o viés esquerdista na cara dele. É brabo, eu sei!

 

Mas estamos aqui pra isso mesmo. A bolha hegemônica dos "progressistas" estourou, graças às redes sociais. Melhor os JOR-NA-LIS-TAS aprenderem a lidar com a nova realidade, pois o bullying não costuma surtir efeito em quem é, de fato, independente.


Leia mais  

Preço do arroz e o excesso de moeda - 16.09.2020


por Hélio Beltrão - publicado no Jornal do Comércio - 16.09.20

 

Urukagina foi o primeiro reformista da história. Após campanha contra os arbítrios do monarca anterior, foi coroado rei de Lagash, na Suméria, em 2.350 a.C.

Entre outras medidas, Urukagina aboliu o controle de preços. Suas reformas chegaram até nós por meio da escrita cuneiforme esculpida em impressionantes cones de pedra, em uma verdadeira "declaração de direitos" centrada no conceito de 'liberdade', ou 'amagi', que teve ali seu primeiro registro histórico.

A história econômica é em essência uma narrativa de 4.400 anos consecutivos de fracassos de medidas governamentais como os controles de preço de Lagash.

Seiscentos anos depois, por exemplo, o Código de Hammurabi de 282 leis estabeleceu: tabelas de preços fixos de aluguel de carroças, de armazenamento de grãos, de serviços médicos, aluguel de barcos, e outros. Houve declínio de comércio durante o reinado de Hammurabi após comerciantes e mercadorias escassearem. O tabelamento teve por consequência um castigo não premeditado àqueles que o código pretendia apoiar.

Portanto, nem tudo começou com os gregos. Mas os helênicos não ficaram atrás em termos de controles de preços. Durante o período clássico de Atenas, em 400 a.C., fiscais denominados 'sitophylakes' impediam preços 'abusivos' dos grãos, em uma antevisão do Código de Defesa do Consumidor. Lysias, escritor de discursos, em sua Peça Oratória 22 "Contra os comerciantes de grãos", pediu em tribunal ateniense a pena de morte para os comerciantes que acumulassem ou aumentassem preços em tempos de escassez. Os atenienses chegaram até mesmo a executar fiscais que não logravam êxito no tabelamento.

Até esta altura, as altas de preço eram geralmente pontuais e derivadas dos chamados "choques de oferta", ou quebras de safras. Já no Império Romano, entrou em cena uma novidade: o fenômeno da inflação, ou alta generalizada de preços, que se tornou política pública.

Desde 269 a.C., ainda na República, o templo de Juno Moneta (origem da palavra "moeda") cunhava o denarius contendo 100% de prata. Mas a partir de 64 d.C., os imperadores passaram a recunhá-lo misturando metais mais baratos. Nero reduziu o conteúdo de prata para 88% (lucro e inflação instantâneos de 15%). O denarius seguiu sendo continuamente depreciado por ligas metálicas até conter apenas 0,5% de prata em 268 d.C.

Diocleciano passou decreto em 284 d.C. no qual atribuía a culpa da inflação generalizada à ganância dos comerciantes e especuladores. Antecipando o governo Sarney e suas prisões contra violadores de seu tabelamento geral, instituiu a pena de morte aos infratores, inclusive àqueles que comprassem acima do preço de tabela.

Em nosso 2020 d.C., o governo ainda não avalizou o tabelamento do arroz, leite, laranja e outros alimentos. Porém muitos seguem acreditando que o comerciante ou o produtor ganancioso é o responsável pelo aumento de preços. Não aprenderam a lição de 4.400 anos.

A alta atual dos preços de alimentos é resultado do aumento de dinheiro circulante injetado pelo BC. Como diziam Milton Friedman, Ludwig von Mises, Roberto Campos, e outros craques, "a inflação é, em todos os tempos e lugares, um fenômeno monetário". A política monetária frouxa do BC promoveu a alta do dólar: o Real tem o pior desempenho entre os principais emergentes neste ano. O dólar caro, por sua vez, contaminou os preços em reais das commodities negociadas no mundo e cotadas em dólares, como o arroz.

Tabelar os preços nunca foi a solução: o comerciante tende a deixar de negociar o produto tabelado porque terá prejuízo; então restringirá a oferta, buscará outros ramos de atuação (de produtos não tabelados), e o consumidor fica com o prato vazio. Mais Urukagina, menos Hammurabi.


Leia mais