Por Percival Puggina
Tenho me lembrado muito de um conhecido filme de terror, produzido no final dos anos 80. O que era brincadeira de meninas adolescentes, um trote telefônico em que diziam “Eu sei quem você é e sei o que você fez” a quem atendesse a um número qualquer discado, se transformou em pesadelo. A fatalidade, de repente, colocou um assassino do outro lado da linha.
A lembrança me vem porque não percebo nas atitudes e palavras dos ministros do STF a consciência de que imensa parcela da sociedade viu o que fizeram e assistiu ao crescente protagonismo do Supremo nos últimos quatro anos. Talvez por isso, os ministros lidam com as reações sociais como se proviessem de um grupelho fanático, terrorista, criminoso, “selvagem”. Não! Não somos cativos em terras de Borba Gato! Somos dezenas de milhões de cidadãos que acompanharam os fatos. Milhões que, nas redes sociais, resistiram a quatro anos de manipulação das suas opiniões pelos interesses financeiros do consórcio da "imprensa tradicional". Milhões que evoluíram da preocupação para o medo e do medo para o pavor em relação ao próprio futuro.
Nós distinguimos a nobre instituição Supremo Tribunal Federal desse estamento judicial esquerdista legado por José Dirceu, Lula e Dilma àquele poder de Estado. Rapidamente, saímos da antevisão para a observação e, desta, para o padecimento das consequências!
Vimos a reversão das prisões após condenação em segunda instância, a anulação de penas impostas em Curitiba e a credibilidade dada a um hacker contra três respeitáveis instâncias do Poder Judiciário.
Vimos o controle policialesco do espaço público e a invasão do espaço privado.
Vimos o princípio do juízo natural ser usado para cessar as comprovadíssimas condenações dos crimes apurados em Curitiba. E vimos o mesmo princípio ser desprezado, logo após, como barata morta, para o ministro Toffoli confiar o inquérito do fim do mundo, em bandeja de prata e guarnição de linho branco, à truculência do ministro Alexandre de Moraes.
Vimos inquéritos abertos para assim permanecer, mesmo depois de a PGR promover seu arquivamento por ausência de quaisquer achados que justificassem sua continuidade. E vimos o disparate de a mesma pessoa togada que se tem por vítima, acusar e julgar o réu.
Vimos o fenômeno social das fake news ascender à condição de crime do qual passaram a decorrer supressões de direitos, sem lei que disponha sobre isso. E vimos a frequente violação da liberdade de expressão pela prática da censura nua e crua, em forma violenta. Vimos a sanção judicial incidindo não só sobre o conteúdo, mas atingindo a pessoa a quem é atribuída culpa, cancelando-lhe o direito de acesso a seus meios de comunicação através das redes sociais. É o “cancelamento” do acusado sem direito de defesa! É o desligamento sumário das suas “rotativas” digitais! Tão absurdo quanto real.
Vimos um parlamentar ser encarcerado e condenado a oito anos e nove meses de prisão por ações que, num foro ungido com a indispensável neutralidade, se resolveriam mediante indenização e cestas básicas. Vimos deputados serem privados de seu acesso às redes sociais, numa brutal violação de suas prerrogativas constitucionais. E vimos um parlamento de cócoras autorizar a prisão do deputado e silenciar sobre os direitos de seus membros.
Vimos a borracha jurídica apagar o prontuário criminal do réu que os nomeou; vimos o tratamento desigual concedido a dois candidatos; vimos o nascimento do conceito de “desordem informacional” para evitar que verdades, reconhecidas como tal, fossem mal interpretadas em prejuízo de Lula, é claro. E vimos demandas desse candidato serem atendidas prontamente enquanto as de seu adversário eram tratadas aos pontapés e arquivadas embaixo do tapete.
Vimos multas de cem mil reais por hora (!) estabelecidas por quem ou não tem noção do valor do dinheiro ou deixou a razão em casa e saiu apenas com a caneta de afrontar quem o contrarie.
Isso e muito mais que isso já sob a poeira dos anos explica a presença de tantos às portas dos quartéis, buscando a proteção e atenção que noutros lugares não teriam.
O descrito até aqui caracteriza um estado de exceção! Na mesma fogueira de vaidades em que arderam as urnas com impressora, o estado de direito e a Constituição, queimam, também, nossa liberdade, nossa dignidade como cidadãos e nossa esperança de um Brasil melhor. As saídas de emergência foram fechadas! Alguém aí não sabe o que vem depois? Então, os manés resistem!
Foi o Brasil empurrado às piores mãos, que passarão a trabalhar juntas? Cuidem-se às Forças Armadas, pois serão elas o objeto de infiltração da vez. No cenário atual, são o que nos distingue da cartilha política venezuelana. Os manés a tudo viram e entenderam. Têm fundamentos mais do que suficientes para pedir socorro. Não adianta fazê-lo ao Rotary ou ao Lions. Nem ao arcebispo de Aparecida. Ora essa!
Por Percival Puggina
Ontem, Dia as Mães, assisti ao vídeo da audiência da Comissão de Comunicação da Câmara dos Deputados na última quinta-feira (aqui). Todo brasileiro deveria, no correr desta semana, tratar de assisti-lo. Isso se tornou imperioso. O vídeo tem pouco mais de três horas que serão usadas de modo importante para o bem de cada um, de sua família e do país. A vida nos colocou neste tempo e neste lugar quando e onde somos testemunhas de dias e de fatos que marcarão de modo indelével nossa existência. Não podemos virar às costas e sair da História, como se fôssemos um Coelho Relojoeiro que jogasse fora seu relógio e se recolhesse entre os sonhos de Alice sobre um país das maravilhas chamado Brasil.
O fato de ser Dia das Mães me aproximou muito do drama e da atitude missionária da principal depoente do evento, Bárbara Destefani (canal “Te atualizei”). Nem de longe dedicaria um cumprimento a qualquer de seus algozes, mas de bom grado viajaria para externar àquela jovem mãe minha profunda admiração. Talento e coragem, senso de humor e seriedade fizeram dela uma figura nacional, sujeita à dupla condição de martírio e assédio.
O silêncio das feministas é um libelo. O silêncio dos senadores sobre o descontrole do STF revira o estômago. O que fazem com Bárbara (que tomo com símbolo de tantos) é a maior evidência de que 1) estamos sob censura no Brasil; 2) a censura vem do topo do Poder Judiciário nacional; 3) tudo mais que se diga sobre o PL 2630 para lhe dar espaço na vitrina das intervenções do Estado é meramente decorativo, acessório. O assunto é censura, sim, num país onde se estabeleceu um poder que não aceita ser contradito. De contrariado, claro, nem se cogita.
Houve um tempo, e já vai longe, em que perante certos tratamentos desiguais, clamava-se contra “dois pesos e duas medidas”. Era o senso popular de justiça. Do mesmo modo, houve um tempo em que punir Chico cidadão comum, mané, pé-de-chinelo, implicava o dever de punir, por iguais motivos, o abonado e influente Francisco, em seus mocassins italianos.
Pois tudo isso ficou para trás, levado na voragem de uma justiça cujos olhos servem a uma visão particular de futuro. Por ser particular, essa visão perde as condições para ser imposta legitimamente a todos. Quais condições? A legitimação dada pelos constituintes à Constituição, pelos legisladores às leis e pelo povo aos parlamentares que elege para representá-lo. Aquele futuro que essa justiça vê (sua compreensão sobre o destino do mundo, da pessoa humana e da sociedade) é apenas um futuro dentre outros possíveis. Perante tal pluralismo, cabe aos parlamentos discernir! Não aos juízes. Não aos ministros. Fora disso, o que se tem é “golpe”, para usar o vocábulo da moda.
Na prática do tempo presente, o pau que bate em Chico só bate em Chico. E não há mais dois pesos e duas medidas. Há apenas um peso e uma singular medida. Ambos servem aos fins de determinada causa, vale dizer, à destruição de uma corrente política e de pensamento dentro da sociedade, cortando suas derradeiras possibilidades de comunicação. Esse prato da balança tem peso zero.