Por Darcy Francisco Carvalho dos Santos
O arcabouço fiscal contém o grande mérito que precisa ser louvado, que é a contenção de gastos, quando isso antes era desdenhado.
Mas daí a concretizá-lo vai uma grande diferença. A menos que exista alguma carta escondida, as proposições do arcabouço fiscal são parecidas com aquela passagem do Gênesis, quando da criação do mundo, em que Deus teria dito: “Exista a luz e a luz existiu”.
Porque isso? Porque os gastos primários (exceto os juros da dívida), entre 1991 e 2016 (quando da implantação do teto de gastos) cresceram, em média, 0,4 ponto percentual ao ano acima da variação do PIB. Então, como de uma hora para outra, vão passar a crescer somente 70% do crescimento da receita (um proxy da variação do PIB), ainda mais depois da criação de tantas despesas novas e de mais 14 ministérios? A criação de ministérios, mesmo que seja uma redistribuição de funções, sempre cria despesas adicionais.
Somente um grande crescimento da receita, como seria o decorrente de um novo “boom das commodities”, como o que ocorreu entre 2003-2011, poderia possibilitar isso, mas, assim mesmo, despesas vinculadas a ele (o crescimento) ou ao PIB, como educação e saúde, ficaram de fora do limite citado e, como são vinculadas, crescerão com a receita. Outra possibilidade seria um aumento de arrecadação do Imposto de Renda, mas metade de seu valor, assim como do IPI, não pertence ao Governo Federal.
Mas a recomendação do Presidente Lula foi: “colocar o pobre no orçamento e o rico no Imposto de Renda”.
Na busca desse objetivo, ele determinou o aumento real do salário-mínimo, de acordo com a variação do PIB de dois anos antes, como era feito nos governos passados de seu partido.
No entanto, por mais louvável que seja socialmente, o aumento do salário-mínimo é um fato que pode inviabilizar o plano fiscal, tantas são as despesas vinculadas a ele. Como pedra atirada, que não volta, reajuste concedido ou garantido por lei não pode ser negado. Por isso, tanto o limite mínimo, quanto o máximo pode ser difícil de cumpri-los, diante da rigidez da despesa. Não dá para dizer ao beneficiário que seu reajuste não poderá ser pago devido aos limites estabelecidos no plano fiscal.
O limite de crescimento da despesa em 70% do crescimento da receita é muito difícil, para não dizer impossível. O número de benefícios previdenciários emitidos nos últimos 20 anos, cresceu 3,1% ao ano. Se acrescermos o reflexo de um crescimento de 2% do PIB (média dos últimos 20 anos) nos benefícios de um salário mínimo, teremos um aumento real da despesa do INSS de cerca de 4%.Se para cumprir esse dispositivo, for negada a variação da inflação ou parte dela, o governo estará dando com uma mão e tirando com outra.
A despesa com Seguridade Social (Previdência, Saúde e Assistência Social) corresponde a 80% da receita líquida do governo. O salário-mínimo tem grande influência nessa despesa, que cresceu 3% reais nos últimos 12 anos (2010-2022), a despeito de todas as carências no atendimento à saúde e das as tantas mazelas sociais de nosso País.
Com o passar os anos, quando cessarem os períodos de transição e os efeitos da reforma da previdência se fizerem sentir, esse crescimento vegetativo deverá cair, quando cederá lugar aos reajustes reais do salário-mínimo. É o que esperamos.
Por Percival Puggina
Mas é infâmia de mais!... Da etérea plaga
Levantai-vos, heróis do Novo Mundo!
Andrada! arranca esse pendão dos ares!
Colombo! fecha a porta dos teus mares.
Castro Alves, Navio Negreiro
As perguntas que farei perturbam meu sono e são comuns ao cotidiano de milhões de cidadãos brasileiros. Como não ser assim, se a nação se dilacera e degenera, o sectarismo se empodera, a burrice impera, o crime prospera, a política se adultera, a Têmis se torna megera e os omissos somem ou dormem? Só eu acordo nas madrugadas pensando nesses motivos pelos quais 41% dos brasileiros (1), entre os quais 55% dos nossos jovens (2), só não desistem do Brasil por não terem condições financeiras de arrancar as folhas de um passado sem esperança e redigir seu futuro noutro lugar?
Os responsáveis por isso conseguem dormir? A nação se inquieta pela apatia de representantes omissos que tanto lhe custam. Como é insignificante, aliás, a relação custo/benefício, somados o mal que fazem e o bem que deixam de fazer! Como conciliam o sono e a culpa? A que destroços, a cupidez e a conveniência pessoal em condomínio com a injustiça reduziram tais almas? Elas simplesmente somem dos plenários quando, da tribuna, algum de seus pares lhes cobra pela apatia e a destruição das instituições!
No entanto, a realidade que vemos é sinistra. O Estado se agiganta perante a sociedade a que deveria servir. A juventude recebe uma educação de qualidade vexatória, últimos lugares nos rankings internacionais do PISA e da OCDE; a cultura nacional está degradada e o próprio QI dos brasileiros, por falta de estímulos, pode estar em regressão. Há décadas, os discípulos de Paulo Freire controlam e tornam cada vez mais sectária a educação nacional, transformando-a numa fábrica de ignorantes miseráveis, com as bênçãos do Estado. Quem escapa dessa máquina de moer cérebros prospera e vira réu no tribunal da desigualdade!
Resultado: chegamos a setenta e cinco milhões de seres humanos dependendo da assistência social do Estado. Do Estado? Sim, sim, o ente causador de todo esse mal aceita sem qualquer constrangimento posar de benfeitor. A pergunta que poucos fazem é: “Se o culpado não for o Estado, quem haveria de ser?”. Certamente a culpa não pode ser imputada a quem decide investir, correr riscos, gerar empregos, pagar salários e ser extorquido com impostos, taxas, contribuições. Essa pergunta derruba século e meio de mentiras sobre os sucessos do socialismo.
Eu quero o meu país de volta! Eu o vi antes, imperfeito, mas humano. Não era uma Suíça, mas era um país amável. O Brasil tinha boa reputação. Hoje é um país de má fama. Eu o quero moderno, mas com aqueles bens do espírito e naquele ânimo nacional que se comoveu e se moveu solidário quando as águas cobriram o abismo no Rio Grande do Sul. Eu quero de volta a energia inusitada que, durante oito anos, saudoso do “meu Brasil brasileiro, mulato inzoneiro”, me levou para cima dos carros de som a verberar corruptos, defender a liberdade e resistir à perdição de uma nação.
Impossível não evocar os versos finais de Navio Negreiro, esbravejados por Castro Alves, se vejo avançar o poder da Casa Grande, a se refestelar em folguedos e extravagâncias, enquanto garroteia direitos de cidadãos outrora livres.
(1)
https://www.cnnbrasil.com.br/politica/polarizacao-politica-41-dos-brasileiros-mudariam-de-pais-se-pudessem-diz-quaest/
(2)
https://g1.globo.com/economia/midia-e-marketing/noticia/2022/08/17/55percent-dos-jovens-brasileiros-deixariam-o-pais-se-pudessem-diz-pesquisa.ghtml