Por - Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves - dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo)
Pouco depois da posse dos eleitos de 1974, um homem trajando camiseta, calção e tênis, foi visto correndo pela pista que separa os prédios do Palácio do Planalto e do Congresso Nacional. Abordado por agentes de segurança, afirmou ser deputado e estar se exercitando fisicamente. Como não portava documentos, foi convidado a acompanhar a equipe, que o conduziu ao seu hotel para buscar a identidade e, depois dos devidos esclarecimentos, recebeu o pedido de desculpas, ficando liberado para a prática do seu “cooper” naquele e nos dias que dali se seguiria. Em vez de abordá-lo, os agentes passaram a zelar pela sua segurança.
O episódio é testemunha do cuidado que naquele tempo se dispensava à Esplanada dos Ministérios e, principalmente, à Praça dos Três Poderes. Quem por ali circulava podia ser abordado e instado a identificar-se. O País vivia sob o regime militar e a capital era mantida sob administração federal, já que o seu governador era escolhido e nomeado pelo presidente da República. A eleição do governante e de deputados, criação da Câmara Legislativa e o status de Estado ao Distrito Federal foram obras da Constituição, em 1988. Jamais se poderia, naquela época, imaginar a possibilidade de invasão e vandalismo nas sedes dos Poderes da República.
No Estado Democrático de Direito – definido na Carta Magna - a unidade federativa passou a administrar Brasília e o entorno e parece não ter ficado completamente claras as funções dos diferentes segmentos de segurança. O que vimos no fatídico 8 de janeiro foi o absoluto desencontro. Ao mesmo tempo em que as redes sociais e a Abin (Agência Brasileira de Inteligência) noticiavam a tomada da Praça dos Três poderes, a Polícia Militar escoltava os manifestantes (supostamente com a idéia de que agiriam pacificamente) e não teve efetivo, nem recursos presentes para contê-los quando se rebelaram. É significativo o informe de que a estrutura de guarda do palácio presidencial foi reduzida como se vivessemos um tempo de paz e, também, não houvesse resistência eficaz às invasões no Congresso e no Supremo Tribunal Federal, já que todas essas instituições possuem guardas próprias.
O certo é quie as invasões ocorreram, os danos são reais e temos hoje mil presos enredados com o problema, que poderia ter sido evitado com a vigilância reforçada e bem coordenada. É inaceitável o ocorrido e há a necessidade de severa e justa apuração, identificação dos reais responsáveis e seu enquadramento na lei. Embora a motivação seja claramente política, deve-se evitar os exageiros retóricos e o proselitismo alarmista. A tarefa é identificar os responsáveis, comprovar a participação de cada um e aplicar a lei, sem maioires delongas.
O Governo Federal se prepara para criar a Guarda Nacional, que deverá ter a tarefa de proteger instalações públicas federais e – diferente da Força Nacional de Segurança, que se forma sazonalmente com agentes emprestados das polícias estaduais – terá agentes próprios admitidos por concurso e treinados especificamente para a missão. Sem qualquer dúvida, é uma postura responsável e evitará a atribuição da segurança a múltiplas instituições que - como vimos – podem negligenciar, uma deixando a ação para a outra e, ao final, nenhuma executando a defesa do alvo em ataque.
Se é uma coisa que os órgãos de segurança costumam possuir na mais alta qualidade é logística de trabalho. No caso de 8 de janeiro, é preciso, além de punir os que efetivamente cometeram crimes, identificar onde estivceram os “furos” na segurança, muito mais para evitar sua repetição do que perseguir os que, sem dolo, tenham sido ineficientes em suas obrigações. Olhar para a frente, sempre...
Por Paulo Rabello de Castro - Publicado originalmente no jornal Estado de Minas, em 11/03/2023.
Matérias técnicas e, por natureza, complexas exigem exame aprofundado e testes sucessivos antes de uma aprovação. Vacinas são um bom exemplo recente. Todo cuidado foi pouco – e muitos ensaios prévios foram necessários – antes de se aprovar a vacina da COVID para uso geral da população. E os estudos ainda continuam. Mas, tragicamente, estamos para votar no Congresso um texto que muda os atuais tributos sobre o consumo (ICMS, ISS, IPI, PIS e Cofins) – matéria complicada e cheia de meandros – sem os mínimos cuidados de verificação antecipada das consequências dessa mudança para um imposto geral chamado IBS (Bens e Serviços) e mais um imposto “seletivo”. Se você quiser saber quais testes foram feitos para estudar os impactos que essa troca acarretará, a resposta espantosa é: Não há testes!
A proposta em discussão no Congresso está nas chamadas PECs 45 e 110, dois textos que reformam a tributação de tudo que você paga em qualquer transação comercial, seja uma compra em supermercado ou loja de construção, ou pelos serviços médicos, pela escola, na passagem de ônibus, na conta de luz, no posto de combustíveis etc. Em tese, a ideia é boa porque os tributos atuais são demasiados e com, pelo menos, 5600 leis diferentes. Vivemos num manicômio tributário. Daí o Congresso ter criado, anos atrás, um SIMPLES, que é a mesma tributação do manicômio, só que menos complicada e se pagando tudo num único boleto. Simplificar a vida do contribuinte, tornando a arrecadação mais eficiente, são objetivos corretos de uma “boa reforma tributária”. Isso é urgente.
O diabo mora nos detalhes: como chegar a uma fórmula simples, que não deixe prefeitos e governadores sem as receitas esperadas e que não signifique, na troca de tributos, que haverá grupos de pessoas, ou atividades econômicas, pagando muito mais do que antes. A boa reforma tem que partir de uma neutralidade e equidistância social em relação às situações vigentes, pois, caso contrário, os eventuais perdedores iriam se insurgir contra a mudança. Esse é um ponto-chave do sucesso de uma boa reforma, que as tais PECs 45 e 110 fazem questão de não observar. De fato, as propostas do governo fazem o contrário: propõem aumentar o custo tributário da cesta básica em mais de 60%, como também, em proporções parecidas, os tributos sobre remédios, médicos e hospitais, cursos e escolas, corte de cabelo, manicure, advogados, e até em transações de carros e motos usados, terrenos e casas. O diabo está escondido por trás de uma narrativa fake de que todos ganharão com a mudança quando todos pagarem a mesma e única alíquota de 25% ou mais (não se sabe ainda qual…) independente de a compra ser a de um carrinho de supermercado ou uma bolsa Louis Vuitton no shopping mais chique de São Paulo.
Os inventores dessa atrocidade tentam tratar, de modo igual, coisas e situações essencialmente desiguais, atropelando princípios, até constitucionais, como a chamada “essencialidade”. Mas o diabo é sincero. Reconhecendo que a população mais pobre vai levar a pior com o aumento brutal de tudo que entra no seu orçamento, a proposta do governo, que se diz popular e sensível com as dificuldades do povo, é fazer um cheque “devolvendo” o tributo de quem não poderia arcar com uma sobrecarga de até 30% nas suas compras. O governo em Brasília dirá quem pode receber a devolução. Mas por que esse passeio de tributos para dentro e para fora dos cofres do governo? Serão milhões de brasileiros correndo atrás de mais uma “bondade” oficial, mais uma devolução, mais uma assistência, como se o País só tivesse desvalidos. O lugar de fazer os ricos e abastados pagarem mais não é no supermercado ou no salão de beleza, mas no imposto de renda, cuja reforma, por sinal, o governo deixou pra lá…
Os problemas das PECs das arábias não param de ser desvendados. O período de “transição” da tal reforma, previsto para durar dez anos, é uma dessas bombas: os tributos antigos ainda existirão, enquanto os tributos novos estarão também em vigor por até dez anos! O inferno vai se instalar nos escritórios de contabilidade, hoje já assoberbados por milhares de leis e decretos diferentes. As infrações fiscais vão se avolumar com dois sistemas tributários distintos funcionando lado a lado (a maluquice programada). Multas e ações contra o contribuinte vão se empilhar na porta das empresas. É previsível que, à vista do pandemônio fiscal, o Congresso faça o que fez com a CPMF, votando, no futuro, para extinguir a invenção malfadada.
Está mais do que na hora de a sociedade, especialmente o empresariado, os líderes políticos de estados e municípios, pararem um minuto para pensar no que estão deixando seus representantes aprovar nos próximos dias. Uma vez instalado e morando de favor, o diabo não costuma gostar de ser expulso da casa.
Texto do jornalista (J.R. Guzzo, publicado no jornal O Estado de S. Paulo
O presidente Lula está armando o que pode vir a ser o maior escândalo em toda a história do Poder Judiciário do Brasil — a nomeação do seu advogado pessoal, Cristiano Zanin, para um dos lugares a serem abertos no Supremo Tribunal Federal. Ele ficaria lá até 2051, quando fará 75 anos e seria obrigado a se aposentar. Serão quase 30 anos como ministro do Supremo; Zanin, hoje, tem 47. Jamais, em qualquer ponto da existência do país, um presidente da República chegou a esse ponto de degeneração ao tomar uma decisão de governo. Na verdade, não há nenhum país sério em todo o mundo em que o chefe da Nação se rebaixe a fazer o que Lula, segundo o noticiário, está querendo — colocar na principal Corte de Justiça do Brasil um empregado que cuida dos seus interesses materiais e cuja independência em relação ao governo será igual a três vezes zero.
Por sua conduta prática, pelo que diz em público e pelas decisões que tem tomado, Lula mostrou nos últimos dois meses que tem tudo para fazer um governo de calamidades, o pior que o país já teve — sim, pior até do que o de Dilma Rousseff. Com essa história de Zanin, porém, ele vai além. Prova, aí, que está perdendo o controle sobre si mesmo e sobre as obrigações do seu cargo; mergulhou naquela zona mental sinistra onde os controles morais desaparecem e o indivíduo começa a ter certeza de que nada do que ele queira, absolutamente nada, pode lhe ser negado. O mundo exterior deixa de existir. Não há mais qualquer respeito pela opinião, pelos argumentos ou pela inteligência de ninguém. Não há, para Lula, nada que esteja fora dele e mereça a mínima consideração. Não entende que seu cargo envolva deveres — só tem desejos. Ele cismou, agora, que o seu advogado tem de ir para o STF; lá, naturalmente, deve continuar lhe prestando obediência. É a confusão definitiva entre questão pública e capricho pessoal. Ninguém faz uma insensatez dessas, salvo, talvez, em alguma republiqueta bananeira de terceira categoria.
http://https://revistaoeste.com/politica/o-maior-escandalo-do-judiciario-esta-em-andamento/